Proibir para Proteger: Medida contra músicas de adultos em eventos infantis gera aplausos em Nampula 

0
304

Nampula (IKWELI) – Nas vésperas do dia Internacional da Criança, que se assinala anualmente a 1 de Junho, a Procuradoria-Geral da República (PGR), através de uma intimação datada de 12 de Março do corrente ano, endereçada ao director geral das Indústrias Culturais e Criativas, divulgou uma nota que proíbe a actuação e reprodução de músicas de artistas adultos em eventos destinados a crianças.

Trata-se de uma medida que visa preservar os valores morais e culturais da infância ameaçados por conteúdos inapropriados veiculados em ambientes infantis, uma vez que, nos últimos anos os promotores têm organizado espetáculos em comemoração ao Dia da Criança maioritariamente compostos por artistas que apresentam conteúdos para maiores de 18 anos de idade.

“Nos últimos anos, tem-se verificado a existência de poucos profissionais da música com conteúdos adequados para a criança, acompanhados de coreografias com tendências para pornografia ou promiscuidade. Esquecendo-se assim que a dança traduz valores culturais, sensações e cultura estética.”

 Tal iniciativa, está a gerar reações positivas entre autoridades culturais, pais e encarregados de educação a nível da província de Nampula, região norte de Moçambique. 

 Em entrevista ao Ikweli, a directora Provincial da Cultura e Turismo, Jamila Bicá, afirmou que a nota da PGR surge numa altura em que eventos infantis, como festas escolares e comemorações públicas do Dia da Criança, têm sido palco de atuações e músicas com letras consideradas impróprias para menores.

“Não é uma medida que nos surpreende, porque a indicação que temos é que é resultado de um trabalho que já vem sendo feito. E esta é uma medida que deve ser cumprida, porque é nossa missão garantir que as crianças não tenham que conviver com conteúdos que podem comprometer o desenvolvimento.”

INAE deve garantir que a medida seja executada

Em 2022, o governo, através do Conselho de Ministros, aprovou o Regulamento de Espectáculos e Divertimentos Públicos, através do Decreto n.o 36/2022 que estabelece normas para a realização de eventos públicos, incluindo a necessidade de adequar o conteúdo ao público-alvo. 

Tal decreto, avança que compete à Inspeção Nacional das Actividades Económicas (INAE) e outras entidades, em função da matéria, a fiscalização do cumprimento do presente Regulamento. 

Diante deste cenário, os promotores de eventos assim como artistas são chamados a revisar o conteúdo apresentado em eventos infantis, de forma a garantir o bem-estar e a protecção das crianças. 

No entanto, Bicá alerta que caberá a Inspeção Nacional das Actividades Económicas garantir que a medida seja cumprida na íntegra pelos promotores de eventos. 

“A INAE é a entidade fiscalizadora, tem a missão de actuar quando as medidas estiverem a ser incumpridas e nós como cultura e Turismo monitoramos, sensibilizamos porque não queremos que os nossos promotores sejam sancionados, porque quando a instituição que tem atribuição e competência própria para fiscalizar tiver que actuar o fará uma vez que existem regulamentos próprios para as sanções.”

Até ao momento, apenas foi autorizado um evento para o Dia da Criança

Já a portas das celebrações de 1 de Junho, o Instituto Nacional das Indústrias Criativas e Culturas (INICC), através do seu delegado regional na província de Nampula, Sonio Sulemane, contou ao Ikweli, que como organização que autoriza a realização dos eventos até ao momento, recebeu apenas um pedido de autorização para a execução do festejo, no entanto o mesmo apresentava músicos com conteúdos adultos. 

“Até então recebemos um único expediente que já tinha cartazes que indicavam a presença de músicos e artistas, no entanto, após a divulgação da nota reinventou-se a natureza do espetáculo, deixou de ter a presença de artistas apenas vão participar com pula-pula e outras actividades de carater de entretenimento infantil.”

Entretanto, o INICC afirmou ter conhecimento de pelo menos três entidades que chamou de “subversivas” que pretendem realizar o evento do Dia da Criança sem a devida autorização. 

 “Da filtragem que se fiz identificou-se três promotores como é o caso da Empório servic Lda, temos um do Bairro Rex e a Tsotsiva esses não estão autorizados pelo INICC e quando é assim o processo é enviado para a INAE que passa a fazer a inspeção e fiscalização e aplicação das devidas multas, por esta subversão de realizar espetáculos sem nenhuma autorização.”

A intimação veio para despertar aquilo que é o nosso trabalho

Por outro lado, o delegado do INICC assume que a intimação da PGR só veio para despertar a verdadeira missão do sector enquanto responsável pela autorização ou não dos eventos. 

“Talvez não tínhamos sido acautelados e com esta presença da intimação apareceu a despertar aquilo que é o nosso trabalho. Esta decisão também é um convite à indústria para investir mais na música voltada para os mais novos. Precisamos de promover artistas infantis e conteúdos criativos apropriados.”

Contudo, Sulemane considera ser uma medida oportuna, mas deve ser acompanhada de um maior envolvimento da família. 

“A família é a base da sociedade podemos aqui delegar a responsabilidade aos promotores, mas enquanto nós como encarregados de educação não usarmos o direito de educar as crianças nas nossas casas, nada será feito. Meu apelo é que não levem as crianças para eventos com conteúdos para adultos.”

Promotores reconhecem que deve haver mudança de postura 

Já, o representante da Associação de Promotores de Eventos na província de Nampula, Siraj Disnescumar Dangi, reconhece que parte da responsabilidade recai sobre os organizadores, que muitas vezes priorizam o entretenimento fácil em detrimento do conteúdo educativo. Por isso, entende que deve haver mais compromisso e uma mudança de postura com vista a proteger a criança. 

“Recebemos essa notícia com bom agrado. Tivemos várias reuniões para reforçar que de hoje em diante, vamos reforçar organização de eventos infantis com responsabilidade, contratando artistas e animadores preparados para trabalhar com crianças. Temos que aceitar que o entretenimento infantil requer cuidado e responsabilidade. Esta medida pode ser um ponto de viragem para a profissionalização do sector neste segmento.

Numa altura em que se verifica uma corrida cerrada para a compra dos bilhetes, é notório que algumas entidades promotoras de eventos criam barreiras entre as crianças através da criação de espaços “vips e normais”.

Uma realidade repudiada pelo representante da associação que considera inadmissível, por isso, apela aos promotores para parar de “diversificar as crianças. Isso de termos crianças que pagam Vip e outros normal não nos deixa bem vistos e entristece as crianças. Imagine que numa turma tem dois grandes amigos e um pai tem possibilidade e outro não, elas estarão em lugares diferentes. Senhores promotores, por favor não vamos diversificar as crianças.”

Pais e encarregados de educação aplaudem

“É desolador ver crianças a dançar músicas com letras de duplo sentido ou a imitar coreografias que não são próprias para a idade delas. Esta proibição é mais que bem-vinda,” disse Eugénia Chivavi.

Dinília Pereira, também celebrou a iniciativa. No entanto entende que a PGR demorou agir, uma vez que o país já dispunha de um regulamento que estabelece normas para a realização de eventos públicos, incluindo a necessidade de adequar o conteúdo ao publico-alvo.

“O Ministério Público enquanto guardião da legalidade do Estado tinha que implementar o seu papel. É uma medida acertada e veio num momento oportuno, demorou sim, mas mais vale tarde do que nunca. Entendemos que o tipo de mensagem que se transmite nesses eventos acabam influenciando no desenvolvimento cognitivo das nossas crianças.”

Mariano outro encarregado sugere que a medida seja reforçada com campanhas de sensibilização nas escolas e nos meios de comunicação.

A equipa do Ikweli contactou a INAE para perceber o nível de prontidão no que concerne a fiscalização e penalização dos promotores que não cumprirem com a medida, entretanto esta prometeu falar oportunamente. 

Resta agora saber se, para além do papel, a medida será efetivamente cumprida e fiscalizada, e se servirá de base para uma nova era na gestão de conteúdos culturais voltados à infância.

Importa destacar que, o Ministério Público adverte que a falta do cumprimento da intimação constitui crime de desobediência, punível nos termos da lei. (Ângela da Fonseca)

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui