Pemba (IKWELI) – A entrada de milicianos no Teatro Operativo Norte (TON), com vista a contribuir no combate de focos de terroristas que assolam e a fustigam alguns distritos da província de Cabo Delgado, pode estar a contribuir negativamente na observância dos direitos humanos, sobretudo dos civis.
Apesar de não ter sido instruído um decreto, ou qualquer documento por parte das autoridades moçambicanas, com vista a legalizar a entrada dos milicianos (forças locais) na luta contra os terroristas, também chamados insurgentes, vezes sem conta as autoridades, incluindo o chefe do Estado moçambicano, Filipe Nyusi, já destacaram o papel do grupo.
Aliás, muito recentemente, através do Comandante-Geral da Polícia da República de Moçambique (PRM), o Presidente da República, Filipe Nyusi, ofereceu na vila de Mueda vários bens para o reforço das actividades das forças locais.
Do apoio, destacam-se 12 toneladas de produtos alimentares diversos que o Chefe do Estado recebeu da população, na sua última visita presidencial à província do Niassa, onde Nyusi disse que os produtos iriam reforçar o trabalho das forças locais na sua maioria composto por elementos dos Antigos Combatentes da Luta de Libertação Nacional (ACLLN), embora não esteja clarificado se o mesmo tratamento abrange todos os distritos assolados pela insurgência ou apenas em Mueda onde, também, o secretário-geral da ACLLN esteve em Julho findo.
Entretanto, durante a sua missão de se juntar aos esforços das Forças de Defesa e Segurança (FDS), no combate aos invasores da pátria moçambicana, os milicianos estão a matar cidadãos inocentes, agindo assim fora das motivações iniciais.
Para alguns milicianos no TON, qualquer suspeita de ser membro dos terroristas é sinónimo de o cidadão perder o direito a vida. Eles matam, alega-se, sem oferecer aos suspeitos a oportunidade de se explicarem.
Uma das evidências que comprovam a actuação cruel dos milicianos contra os cidadãos inocentes, aconteceu em finais de Julho do ano em curso, no posto administrativo de Chai, distrito de Macomia, na nortenha província de Cabo Delgado, quando elementos das forças locais posicionados naquela parcela moçambicana interpelaram e executaram dois indivíduos de nacionalidade moçambicana que, supostamente, acabavam de fugir das bases dos terroristas, depois de quatro meses como reféns.
Para além da falta de questionamento que conduziu à rápida tomada de decisão em termos de execução dos dois jovens, os milicianos avançaram pela exposição enquanto torturavam os malogrados numa filmagem em que o vídeo viria a ser viralizado nas redes sociais.
O Ikweli soube das suas fontes em Macomia, que um dos jovens vítima desta barbárie dos milicianos, em vida respondia pelo nome de Bento que se diz ser natural de Macomia-sede, por sinal sobrinho do antigo delegado político do partido Movimento Democrático de Moçambique (MDM) no distrito de Macomia, Luís Abdala. Para o outro jovem não foi possível apurar a sua identidade, mas o Ikweli soube que, o mesmo era natural do distrito de Moma, na vizinha província de Nampula.
“Sim ele foi um familiar directo, foi um sobrinho. Aqui em Moçambique não há justiça”, disse sem entrar em detalhes Luís Abdala, antigo delegado político do MDM e membro da Comissão Distrital de Eleições em Macomia.
No pouco questionamento que tiveram antes de serem executados pelas forças locais de Chai-sede, o jovem Bento explicou aos milicianos que foram encontrados na aldeia 5º Congresso e pediram boleia para chegarem à Macomia. Entretanto, o motorista desviou o destino deles e levou-lhes às mãos dos milicianos que se encontravam em Chai.
Para caírem nas hostes dos insurgentes, Bento explicou, nas vésperas da sua morte, que foram à comunidade de Mucojo no mesmo distrito de Macomia, na companhia de outras pessoas, a fim de pescar, e terão sido capturados pelos insurgentes e permaneceram na base dos terroristas cerca de quatro (4) meses.
Nossas fontes na vila de Macomia garantem que Luís Abdala, antigo delegado do MDM naquela circunscrição geográfica, contactou as autoridades locais, com enfoque para o Comandante Distrital da Polícia da República de Moçambique (PRM) de Macomia, mas foi informado que os milicianos, e outros populares que participaram na execução dos dois jovens, não tiveram orientações das autoridades.
Aliás, segundo nossas fontes, a polícia em Macomia alega ter informação sobre aquele assassinato bárbaro perpetrado pelos milicianos, através do vídeo partilhado nas redes sociais.
Refira-se que a falta de domínio dos princípios legais sobre a vida das pessoas como direito fundamental, aliado à falta de formação em matérias de Direitos Humanos e por estarem desprovidos de quaisquer métodos científico de investigação, podem concorrer nas decisões precipitadas e cruéis das forças locais nos distritos de insurgência na nortenha província de Cabo Delgado. Aliás, segundo fontes e que vem no vídeo, os visados imploraram várias vezes para que fossem dados a oportunidade de viver o que não foi suficiente para os executores.
“Se os milicianos tivessem formação em Direitos Humanos, acredita-se que teriam agido de outra forma, e que os malogrados poderiam servir de mais uma fonte de informação no concernente às pistas dos terroristas, um grupo considerado complexo no seu combate à escala mundial”, comenta uma fonte entendida na matéria.
Entretanto, após o incidente, segundo apuramos, nada foi feito no sentido de serem responsabilizados os actores daquele crime. (IKWELI)