Nampula (IKWELI) – É caso para dizer que as circunstâncias não devem ser um empecilho para o progresso. Mulheres deslocadas de Cabo Delgado tiraram a veda da repressão e decidiram rumar ao ensino superior, mesmo diante das dificuldades enfrentadas após perder tudo na sua terra natal e terem que se refugiar em Nampula.
O sonho de fazer o ensino superior, começou a tornar-se realidade, após receberem bolsas de estudo na Universidade Rovuma (UniRovuma), em Nampula.
Uma das beneficiárias é Ancha Chomar, jovem de 22 anos de idade, natural de Cabo Delgado, a qual conta que inscreveu-se na universidade para futuramente conseguir um emprego. “ Inscrevi-me na universidade para ter oportunidade de emprego futuramente, fui muito persistente, porque muitas vezes diziam que não tinha vagas para bolseiros. No meu primeiro ano foi difícil porque eu não tinha um celular grande, tinha que usar um pequeno da minha irmã.”
Fora as dificuldades geradas pela falta de condições, Chomar avança que passou preconceito por parte de docentes por ser natural de Cabo Delgado. “Concorri para as bolsas no mês de abril de 2021 e os resultados foram anunciados no mês de junho, depois da reunião que tive só começamos com as aulas, eram bolsas para Mocímboa [da Praia], Nangade, Muidumbe, Palma, Macomia e Quissanga, precisavam desses deslocados para serem facilitados, não tivemos exames para entrarmos na Universidade Rovuma. No princípio tinham docentes que nos chamavam de al-shababe’s, qualquer exemplo da turma usava a nós, eram gozos de um lado para outro,” contou a fonte.

Assim como Ancha, Rabia Bernardo, de 30 anos de idade, também finalista do curso de direito, moradora do bairro de Napipine, conta que “sai de Mocímboa da Praia no ano de 2017, logo que iniciou a guerra. Sobre a vaga, o meu pai tinha dito para não vir a Nampula porque não tinha família e eu disse para ele que a oportunidade é essa, e eles me disseram que não tinham como me fazer estudar, mas eu fui mais persistente, concorri, graças a Deus fui apurada para a bolsa, isso em 2021.”
Apesar da ambição que sempre carregou, Rabia não se esquece das dificuldades. “O constrangimento que tenho tido é na parte do valor, uma vez que o curso de direito precisa de muito material, digo dos livros, e para ter acesso a esses livros, não é fácil. Ganhamos a bolsa sim, mas os responsáveis pagam no tempo impróprio, assim nas férias e o valor da bolsa seria para suprir as necessidades básicas, como o caso da compra de material, arrendamento de casa e alimentação. Mas esses só pagam a bolsa no mês de dezembro, as necessidades são várias, os nossos pais devem vender mapira, milho, juntar o dinheiro e enviar eu poder comprar material, pagar renda e comida.”
“Assim que terminar o curso, gostava de ser uma Procuradora [da República] para poder ter mais conhecimento e investigar casos parados, por isso apelo as outras mulheres que querem estudar, mas que sentem receio, uma maior entrega. Dizer que não há nada que não se possa alcançar, para alcançar um certo objectivo precisa-se ter coragem e fé, se acreditar que sim, eu consigo,” asseverou Rabia.

Brendina Eugénio Umeme é outra mulher que não se deixou levar pelos desafios e formou-se em Ensino Básico. “No início, tive dificuldades para acessar aulas online que por vezes nós deslocados enfrentamos comentários negativos não só de docentes, mas de colegas também. Mas com esforço e determinação, eu consegui concluir o curso e estou finalizando a minha monografia.”
Essas histórias mostram que, apesar dos obstáculos, a força de vontade e a persistência das estudantes deslocadas fazem toda a diferença. A educação tem sido um caminho de esperança e novas oportunidades para muitos que tiveram que recomeçar suas vidas em Nampula. (Atija Chá)