Nampula (IKWELI) – As manifestações pós-eleitorais que concorreram para na vandalização e destruição de bens e infra-estruturas públicas, ditaram o ressurgimento da criminalidade em vários pontos do país e os bairros periféricos da cidade de Nampula não são excepção.
Nesta matéria, o Ikweli conta a história que brada aos céus na conhecida zona do Condomínio, no bairro de Namicopo, onde um posto policial foi destruído por manifestantes e o local transformado em mercado.
Sobre a criminalidade naquela circunscrição, a história de já alguns anos, começou quando a polícia carecia de espaço para construir um posto policial e pediu ao senhor Selemane Selemane que cedesse um lugar, sob a promessa de que ficaria ali por pouco tempo.
Com medo da polícia, Selemane cedeu o espaço, mas o que haveria de durar pouco tempo, ultrapassou uma década. “O nosso acordo era de eles ficarem por um curto período até encontrarem seu espaço, mas eu sempre pedia o meu espaço e eles simplesmente respondiam que devolveriam um dia, assim que conseguissem espaço para eles,” afirmou o senhor Selemane
No entanto, durante as manifestações pós-eleitorais de 2024, onde foram vandalizadas infraestruturas governamentais, o posto policial do Mercado-Condomínio não escapou, todos os agentes da polícia que se encontravam em serviço colocaram-se em fuga e os manifestantes destruíram a infraestrutura, deixando o local totalmente irreconhecível.
Após a invasão, o senhor Selemane viu a oportunidade de reaver seu espaço, tendo falado com alguns vendedores para ocuparem o mesmo. “O próprio dia que o posto foi destruído, eu estava fora da cidade, quando cheguei, liguei para o chefe do posto para saber como seria o passo a seguir, e simplesmente respondeu que o espaço é teu, você sabe o que vai fazer,”, a resposta do chefe do posto deu a ideia ao senhor Selemane, pois “me arranjei e construi um alpendre para segurar este meu espaço e na esperança de conseguir algo para me sustentar, porque com 67 anos de idade, já não tenho forças para procurar pão, porque o espaço é meu e não do governo”.
“Acabamos de construir estas bancas, ainda não combinamos como será o meu de pagamento, uma vez que outros ainda não compraram as suas mercadorias, eu não vou cobrar a ninguém, não vou estipular um valor para eles me darem, eu quero que eles vendam e o que conseguirem para construirmos esse mercado. Agora são 19 comerciantes e 19 bancas, dos quais 4 estão a vender e o restante ainda não tem a sua mercadoria pronta,” acrescentou Selemane
O Ikweli contactou alguns vendedores que beneficiaram das novas bancas naquele mercado, os quais mostram-se felizes com a oportunidade de ter um espaço próximo das suas residências.
“Nós estamos satisfeitos com esse novo espaço, porque o outro lado não chegava para todos nós, outros vendiam no chão e no tempo chuvoso todo mercado ficava sujo de lama. O dono disse para fazermos as bancas, para termos algo, como todos nós somos pobres, mas não passaremos a pagar tão já, uma vez que ainda não conseguimos nada. Eu por enquanto estou a vender papahi [peixe seco], assim que conseguir um valor de mercadoria, irei encher a banca,” narra Lino Vida, morador e comerciante do condomínio.
Outro vendedor é Carlitos Afonso, pai de 9 filhos, residente no bairro do condomínio, o qual declarou que “estou a vender há um mês e desde que comecei, nunca vi ou ouvi que conselho municipal veio cobrar taxa”.
“O combinado foi construirmos o mercado, passar um mês a vender, depois de passar um mês, aí sim ele passará a cobrar um valor de 10,00Mt (dez meticais) por dia, passando esses dias, o dono dirá quantos meticais passaremos a pagar por mês,” contou Pedro Manuel, pai de 4 filhos e comerciante no local.
O secretário daquela zona residencial, por sua vez, lamentou o facto de não ter mais um posto policial naquele ponto, facto que tem estado a aumentar a vulnerabilidade do bairro face a criminalidade.
O recurso à justiça por mãos próprias
Apesar do alívio trazido aos vendedores, por terem um mercado próximo, a falta de uma subunidade policial já há dois meses está a dar espaço ao recrudescimento da criminalidade e a justiça pelas próprias mãos.
Desde a vandalização do posto, houve registo de, pelo menos, dois corpos sem vida e vários assaltos a residências.
Uma das residências que sofreu foi a da dona Atija Juma, residente naquele bairro há mais de 5 anos, a qual contou com lágrimas o quão foi terrível ter a sua residência assaltada na tarde de domingo (16.01).
“Mal saíram da minha casa, foram roubar bens do meu filho mais velho, levaram roupas, bluetooth [aparelho de som] e um celular, agradeço apenas por lhe deixarem com vida,” contou.
Outras mulheres que se juntaram a conversa, repudiam a vandalização do posto policial, pois afirmam que “passamos mal, quando voltamos de noite dos nossos negócios, somos agredidas, há dias, quase foi estuprada uma menina que voltava da escola, a sorte é que foi socorrida por um taxista”.
Na edição 1618, do dia 11 de Fevereiro, o Ikweli reportou igualmente uma matéria sobre o assassinato de dois indivíduos de proveniência desconhecida, facto que colocou em pânico a comunidade daquele ponto residencial. “Nós que vivemos aqui nas montanhas estamos mal, porque é muita coisa estranha que acontece. De noite passam pessoas estranhas, é roubo de dia, a população gosta de fazer justiça com as suas próprias mãos ao invés de ir procurar um posto policial, então nós moradores é que ficamos desanimados em viver neste bairro,” disse Octávio Jorge, um dos moradores daquele bairro.
Este é o segundo acto de justiça pelas próprias mãos em menos de três semanas naquela unidade residencial da cidade de Nampula. Este terá sido antecedido pelo assassinato, na zona, de um suposto ladrão, de nome Zap, também chefe de uma gang ladrões, morto após espancamento sob acusação de usurpar terrenos e outros bens.
Apercebendo-se da presença do Ikweli no local, vários moradores juntaram-se para apelar às autoridades competentes para que construam um posto policial naquele área residencial. (Atija Chá & Ruth Lemax)