Nampula: Famílias já brigam por água potável

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Nampula (IKWELI) – Há algumas semanas que a empresa Águas da Região Norte (AdRN), delegação de Nampula, declarou estar com baixos níveis de captação diária de água potável para o abastecimento do maior centro urbano do norte de Moçambique, estando a registar assim uma descida de cerca de 96% da sua capacidade máxima.

Em virtude disso, a cidade de Nampula tem vindo a registar, nos últimos tempos, acentuadas crises do precioso líquido, sendo a situação mais crítica em alguns bairros com mais destaque para as zonas periurbanas e periféricas da urbe, onde os moradores têm, frequentemente, recorrido a fontes com deficiência ou mesmo desprovidas de salubridade adequada para o consumo humano.

A título de exemplo, na unidade comunal Amílcar Cabral, no bairro de Namicopo, nos arredores da cidade de Nampula, moradores locais recorrem a poços tradicionais para a obtenção do precioso líquido, com vista a satisfação das suas necessidades, desde o consumo até a manutenção da higiene pessoal e colectiva dessas famílias, pese embora reconheçam que não sejam fontes seguras, pois, segundo dizem, os poços por eles usados localizam-se nas proximidades de valas de drenagem e, portanto, propensos a diversas formas de contaminação e disseminação de doenças de origem hídrica.

Entretanto, nem mesmo a natureza tem cooperado devidamente com esses moradores na colmatação da crise de água que os assola, pois, com os poços secando, gradualmente, na medida em que as enchentes servem-se deles, alguns moradores são obrigados a tornarem-se até mesmo “guardiões nocturnos dos poços”, fazendo com que alguns fiquem até a meia-noite esperando que os níveis de água subam para conseguir extrair e encher em alguns recipientes que sejam.

“Com essa crise de água, há pessoas que saem de muito longe, quase todo Namicopo a recorrer a mesma água que nós, também, precisamos. Como eles vêm muito cedo, por aí as 3h até 5h para tirar água nesta área, nós os donos dos poços acabamos ficando sem água e temos que esperar até 18h ou 19h para liberarem. Então, quando eles saem nessas horas, nós aproveitamos entrar e tirar água, é daí que saímos às 23h ou 00h, algo que não é normal, tendo em conta os riscos do próprio bairro em si”, contou Miria Luciano residente local.

Essa busca nocturna pela água, geralmente feita por mulheres e crianças, tem sido, segundo referiram, muito perigosa para elas, não só por se tratar de um bairro que é conhecido pela sua onda de criminalidade, mas também pelo risco que correm de uma possível queda para os poços por conta da escuridão.

“Eu sou testemunha, tenho visto crianças, raparigas e muitas senhoras a ficarem o dia todo a espera de água e a voltarem de noite. É um risco, mas fazer o quê! Temos que ter água para beber e fazer outras coisas, porque sem água não há vida, água é tudo na vida, então corremos esse risco mesmo assim”, concluiu Ana Muagy.

Se a actual crise de água que assola a cidade trouxe dificuldades para alguns bairros, para os moradores da unidade comunal 25 de Setembro, no bairro de Namutequeliua, nos arredores da cidade de Nampula, a situação veio “cortar as esperanças”. Há meses que a população daquela zona residencial enfrenta uma grande escassez de água potável, facto que dificulta a melhor satisfação das necessidades quotidianas básicas e observância de boas práticas de higiene.

Tudo porque, segundo contam, vive-se um dilema entre o abastecimento de água pela AdRN e a recolha de resíduos sólidos na lixeira próxima ao cemitério de Cotocuane pelas entidades camarárias. Ou seja, quando se faz a recolha de resíduos sólidos, quase sempre causa-se a ruptura da principal conduta que conduz e abastece água naquela zona, e consequentemente, o lixo, lama e algumas vezes água encharcada penetram a tubagem.

“Já se passa mais de um ano que a situação de água está complicada. Tem uma tubagem que desce para aquela área, passando da lixeira e toda a vez que o pessoal do município vai tirar lixo acaba danificando aquele tubo principal e, nalgumas vezes, não fecham logo de imediato, pelo menos não nos primeiros dias. Então jorra água e fica toda poluída e quando voltam para fechar tem sido tarde demais”, lamentou Inusse Mitas, morador daquela região há mais de quinze anos.

Este continuou dizendo que “com o tubo danificado e a água já contaminada, acaba se optando por fechar o abastecimento de água para o bairro. A reparação do tal tubo tem levado muito tempo, chegando a demorar dois, três, quatro meses ou mais e vezes há em que é substituído o tubo, mas ainda assim parece que eles se esquecem de abrir e abastecer água para a zona. É uma situação recorrente, repara-se o tubo, na hora de recolher lixo danifica e assim sucessivamente”.

Portanto, por um lado a AdRN não abastece água com regularidade há mais de um ano, por outro lado, nas vezes em que a sorte toca as torneiras e jorra um pouco de água, geralmente é contaminada e, naturalmente, imprópria para o consumo humano, pois esta sai escura e com cheiro muito forte, resultando assim nessa situação embaraçosa de crise infinita.

Complementando a mesma linha, Bruno Gonçalves, também morador da zona de Cotocuane, disse ao Ikweli que “por exemplo, recentemente, o tubo foi substituído e a água sai. Mas não era boa, a água saía suja e cheirava muito mal que não dava para nada. Nem para tomar banho ou lavar loiça e muito menos para consumir. Então deixávamos torneiras abertas por cerca de quatro dias com a água a entornar para ser se a sujidade e o cheiro diminuíram, mas nem com isso, acabou parando sem sair água limpa”.

Em face a reincidência e a demora na reposição da situação, os moradores dizem tentaram, em diversas ocasiões, aproximar as entidades competentes com o intuito de reportar a ocorrência. “nós já recorremos e a resposta que eles davam em algumas vezes é que tinham o conhecimento e que iriam organizar. Diziam também que em certos momentos o que lhes levava a demorar era a falta de material, mas que a situação seria ultrapassada”, explicou Faizal, residente local.

Para tentarem colmatar a situação e suprir as suas necessidades, que incluem beber e cozinhar, os moradores daquela zona da cidade de Nampula vêm recorrendo aos poços tradicionais locais. Entretanto, nos últimos tempos esses também tendem a simular sinais de seca, o que aflige ainda mais a população daquela região do maior centro urbano do norte de Moçambique. (Isidora Fernando)

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