Nampula (IKWELI) – Nos dias de hoje, o celular tornou-se num companheiro indispensável, independentemente da faixa etária, por isso especialistas alertam que esse companheirismo na primeira infância pode ser prejudicial.
Entretanto, nos últimos anos é notório, em qualquer parte do mundo, o uso excessivo de dispositivos electrónicos, neste caso celular por crianças menores de idade de 2 anos em diante, uma situação que preocupa alguns especialistas que advertem que o uso excessivo dos mesmos atrapalha as interações sociais, pois, limita o tempo em que as crianças poderiam passar correndo e praticando outras actvidades físicas.
Em entrevista ao Ikweli, o sociólogo Óscar Namuholopa, explicou que a concentração excessiva nos celulares diminui a capacidade de comunicação, e posterior sociabilidade. “Nós temos assistido que crianças têm sido apáticas, elas se apegam muito aos aparelhos electrónicos, têm mais amigos virtuais e poucos reais e isso pode não ser bom, porque vamos ter a médio ou longo prazo indivíduos que dialogam com os aparelhos electrónicos do que com seres próximos e, a ser assim, teremos indivíduos menos sociais”, disse.

O sociólogo entende que tal situação pode fazer com que as crianças não desenvolvam capacidades próprias sem o uso de aparelhos, como por exemplo a escrita, assim como contas, fazendo com que num futuro próximo tornem-se indivíduos pouco críticos do ponto de vista de consciência pelo facto de obterem apenas uma inteligência artificial. “Não vão saber como escrever certas palavras sem ajuda de aparelhos electrónicos, não saberão fazer contas porque tudo consultam no aparelho que dá resposta devida, são crianças que num futuro próximo correm o risco de não ter o domínio da ciência que estudam na escola, porque tudo que é questão submetem ao aplicativo e, este dá resposta devida, teremos indivíduos pouco pensantes e nosso futuro fica comprometido, porque nós temos que pensar com as nossas próprias faculdades mentais e colocar apenas o aparelho para auxiliar”.
No entender de Namuholopa, este seria o tempo ideal para que os pais começassem a impor limites no uso de celulares para que as crianças possam desenvolver relações afectivas com primos, amigos, vizinhos, entre outros. “É preciso colocar limites para que não sejam completamente dependentes dos aparelhos, que tenham algum espaço para que possam conviver com outras pessoas, de forma a desenvolver esse afecto humanizado. Em algum momento temos visto crianças que ficam até de madrugada acordados ao celular, os pais pensam que eles estão a dormir. É necessário que os pais disciplinem os celulares dos filhos para que acessem apenas programas infantis para evitar invasões de sites com conteúdos que podem influenciar de forma negativa no desenvolvimento cognitivo da criança”.
Outro sim, a fonte entende que a falta de diálogo nas famílias contribui para que as crianças sejam dependentes de dispositivos, justificando que por vezes, os progenitores oferecem tais celulares como forma de se “desculpar” pela ausência e tal cenário poderá conduzir para uma geração de pessoas apáticas e egoístas. “Estamos a ver uma sociedade de pessoas apáticas que brincam consigo mesmas e com os celulares e não conseguem lidar com uma pessoa próxima, esta é uma realidade que, até certo ponto, pode conduzir para o egoísmo, indivíduos que só se concentram em si próprios e na sua realidade e não se importam com a realidade do outro porque de certa forma não convivem com eles.”

Por outro lado, o psicólogo Rafael Fernandes adverte que o exagero faz mal à saúde da mente, do corpo e os efeitos podem ser ainda mais danosos nas duas primeiras décadas de vida por conta dos raios emitidos pelo dispositivo. “Quando uma criança usa de forma excessiva o dispositivo, a impede de dormir ou descansar o suficiente sem contar que recebe raios do sistema e são essas crianças que daqui a alguns anos vão ter problemas psicológicos muito sérios, há países em que o celular tem minutos para o seu uso, se usado acima do minuto o sistema corta”.
Risco de um envelhecimento precoce
Mas o problema não se limita à primeira infância, mesmo crianças um pouco mais velhas precisam ter acesso limitado e supervisionado ao mundo digital, tal como avança Fernandes que comunga da ideia de que o celular retira não só a criança, mas também os adultos, da convivência social e reduz a qualidade de sono que é recomendada pela saúde que são 8 horas de tempo. “E o impacto é muito desastroso, tem crianças que vão começar a envelhecer cedo por causa do uso do celular, porque ele está a fazer um esforço mental e aquela concentração obriga uma actividade redobrada da mente e pode resultar no envelhecimento precoce.”
A fonte repisa que celulares abrem a mente das crianças ao mesmo tempo que prejudicam por conta do tempo que é usado que destrói outras funcionalidades psicológicas. “A pessoa pode ficar inteligente, mas está inteligente naquele mundo tecnológico, quando sai para o mundo natural torna-se um novato, não sabe nada. Quando as crianças pequenas estão fixadas nos celulares, elas perdem oportunidades de praticar e dominar outras habilidades importantes”
Pais procuram alternativas para afastar os filhos dos celulares
A equipa do Ikweli conversou com alguns pais e encarregados de educação para perceber o nível de percepção sobre as vantagens e desvantagens do uso do celular na primeira infância, estes foram unânimes em afirmar que muitas vezes tem sido uma luta retirar dos filhos os dispositivos, mas que como alternativa, buscam melhores soluções para “driblar” os pequenos.
Tal como avançou Marta Afonso, mãe de três crianças, com 2, 11 e 12 anos respectivamente. A mesma conta que a maior luta tem sido com a mais nova de 2 anos de idade, que diariamente tem mostrado renitência quanto ao uso do celular. A menina chega até a pedir brinquedos como panelas, bonecas entre outros, no entanto, o celular é sempre o primeiro amor. “Os mais velhos ainda consigo gerir, quando chego a casa luto para que eles fiquem no quarto a estudar e sempre digo para que não fechem a porta, fiz questão de procurar alguns livros infantis e educacionais, por vezes eles pensam que só podem estudar quando tem TPC, eu digo e mostro que não, digo a eles para pegar nos livros que comprei para exercitar o gosto pela leitura, e possam também cultivar o hábito de estudar sem o TPC e não estar sempre ao telefone, graças a Deus eles já não têm esse hábito de pedir o celular, mas em contrapartida não tem sido fácil com a mais nova, as vezes vem com as amiguinhas para brincar, mas ela limita-se a implorar pelo telefone para jogar e entrar no tik tok e lá não existe nada que vai educar os nossos filhos”.
Marta Afonso reprova o comportamento de outros pais que deixam os celulares a tempo inteiro com os filhos, no entanto, aprova o uso do mesmo apenas em tempos de férias. “Eu comprei apenas um telefone para chamadas para quando eles quiserem falar comigo, tirando isso, telefone não é para crianças, desaconselho muitos pais a dar telefones aos filhos, porque por mais que a gente diga que tem capacidade de controlar o que eles vêm, nem sempre estaremos ali para ver o que eles assistem. Eu tenho uma prima que ofereceu um celular ao filho de 12 anos, o que meu sobrinho posta, fico horrorizada, uma criança a postar coisas sobre namoro, o que ele sabe sobre isso? Posta coisas sobre criminalidade nesta época de manifestações, entende o que sobre aquilo? Ele sabe porque o país está em manifestações? Celular não é uma coisa boa”.
Por outro lado, Anacleto Mazive, pai de três crianças, vê vantagem no uso de celulares na primeira fase da vida, pois entende que abre a mente das crianças colocando-as com um intelecto mais avançado, no que diz respeito a fala.
Ao mesmo tempo entende que já na fase mais crescida, faz com que ela se desligue do mundo social. “Isso faz com que a criança seja menos social, porque as outras estarão a brincar ou a fazer algo que ela não sabe porque vive num mundo só dela e quem faz com que isso aconteça são os pais que dão acesso ao celular. Se eu como pai entrego o celular a criança para que possa calar ao fazer barulho induzo a criança a gostar do celular, ou seja, eu como pai me afasto da criança e arranjo um meio para afastar-me dela e colocá-la num mundo imaginário, outro ponto é que limito a criança a brincar com as outras e isso coloca a criança num estado de dependência e prejudica a sua socialização”.
Chaminy Arlindo, mãe de dois, entende que apesar do celular ajudar no desenvolvimento psíquico da criança, o mesmo retira os processos e as fases “boas” de ser criança e apela que os pais optem mais em comprar dispositivos inteligentes que ensinam os menores a ganhar habilidades.
“Quando passa mais tempo ao celular ela fica anti-social, por mais que esteja com amigos que estão lá para brincar, ele não vai ter tempo porque já está viciado no telefone. Eu como mãe diria que deve-se colocar um horário fixo, ou se for para comprar um celular que seja um inteligente que tem apenas jogos e que ensina a criança a escrever, desenhar, eu apelo que as mães tivessem mais cautela”.
Olívio Silvina Mateus tem, igualmente, uma filha menor de idade de apenas cinco anos, o mesmo diz estar a passar por situações difíceis, pois reconhece que a menor tem passado maior parte do tempo no celular ao invés de brincar com seus amigos.
Entretanto, afirma que vezes sem conta tem monitorado os conteúdos que a mesma tem acompanhado. “Já tentei por várias vezes proibir a criança de estar apegada ao telefone, a menina quando está sem celular fica isolada ao passo que quando está com o celular o ânimo é outro, mas tem esses dois pontos o negativo e o positivo. O negativo é que ela pode entrar em alguns sites que podem ser prejudiciais, no nosso país acho que não estamos tão preparados para que as crianças de tenra idade se apeguem ao telefone, o que se verifica é que os pais dão essa liberdade”.
Enquanto isso, a Organização Mundial da Saúde (OMS), através de uma divulgação feita em 2019, recomenda que as crianças até 5 anos de idade passem menos tempo diante de telas e não devem passar mais de 60 minutos por dia em actividades passivas diante de uma tela de smartphone, computador ou TV.
Segundo a instituição, cerca de 40 milhões de crianças em todo o mundo em torno de 6% do total de meninos e meninas estão acima do peso. Desse grupo, metade das crianças está na África e na Ásia, tendo como motivo o uso excessivo de celulares. (Ângela da Fonseca)