Violência Patrimonial em Nampula: Viúva forçada a abandonar a casa por familiares do falecido marido

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Nampula (IKWELI) – Uma cidadã que responde pelo nome de Maria Afonso, de 58 anos de idade, viúva e residente na unidade comunal 1º de Maio, nos arredores da cidade de Nampula, foi expulsa e obrigada a abandonar, na tarde desta terça-feira (06), a residência onde viveu com o seu marido, oficialmente casados há mais de 30 anos. 

Segundo a viúva, tudo teve o seu início um mês após o desaparecimento físico do seu parceiro, em 2019. Quando a sua concunhada procurou-a para exigir o espaço, alegando que o mesmo pertence aos seus familiares. 

“Comecei a viver aqui em 1989 com o meu marido e não tinha casa, o que tinha era apenas sucatas de carro. Com o passar do tempo fomos construindo essas casas que estão a ver. Mais tarde, meu marido perdeu a vida e depois de um mês aparece essa senhora a dizer que o espaço lhe pertence e que eu tenho que sair”. 

O caso que está a ser disputado há quase cinco anos, não encontrou solução ao nível das estruturas do bairro, o que fez com que recorressem as instâncias judiciais. 

Maria Afonso disse ao Ikweli não perceber as motivações que levam sua concunhada a exigir o espaço, após a morte do seu marido. Diz ainda que as casas foram construídas com esforço do casal, sem apoio dos familiares do falecido.

Entretanto, vezes sem conta, a viúva vinha recebendo pressão e ameaças da concunhada e o advogado para entregar a casa e abandonar o espaço.  

“A senhora sempre vem-me ameaçando para sair da minha casa. Hoje estou a ver essas pessoas a dizerem que tenho que sair daqui, eu não sei para onde ir. Quando meu marido estava vivo nunca chegaram aqui, ela está a dizer que o lugar é dela, mas eu tenho documentos que comprovam que o espaço me pertence”. 

Facto curioso é que, mesmo com os documentos do município que comprovam que o espaço a pertence, a viúva foi obrigada a assinar um despacho do tribunal judicial que indica que a mesma consente a entrega da casa. 

“Um dia ela veio aqui em casa com alguns agentes do tribunal e me obrigaram a assinar um documento, só que mais tarde, com mais calma decide ler, foi quando me apercebi que eu estava a aceitar a entregar as minhas casas”.

Rosario Julio, Secretário do bairro

Já, o secretário do quarteirão, Rosário Júlio, explicou tratar-se de um caso que ultrapassou as estruturas locais, visto que as partes nunca chegaram a um entendimento. 

Júlio confirmou ao Ikweli que a viúva sempre viveu naquele espaço com o seu marido e que nunca houve problemas relacionados com disputa. 

“Quando essa senhora veio aqui com o marido só tinha uma pequena cabana que foi melhorada aos poucos, os anos foram passando e ele começou a construir essas outras casas que estão aqui, pouco tempo depois morreu. Quando perdeu a vida, as coisas começaram a complicar-se para essa senhora. Tentamos resolver, mas não conseguimos, levaram o caso ao tribunal e hoje é isso que estamos a ver aqui”.

 

Familiares da viúva questionam decisão do tribunal 

O irmão da viúva, Florêncio Afonso, tenta compreender a autenticidade do despacho do tribunal judicial que autoriza o despejo. 

Trata-se de um documento a que o Ikweli teve acesso, proveniente da 2ª Secção do tribunal judicial da província de Nampula, intitulado por “Termo de Investidura”, em cumprimento do despacho para “entrega de coisa certa com processo sumario nº 24/21”. No entanto, o mesmo não apresentava o carimbo do tribunal, facto que levanta dúvidas e questionamentos por parte do irmão da viúva. 

“Eu queria perceber do tribunal os motivos desse acto, porque estamos a ver aqui dois documentos, um não tem carimbo e o outro ela diz que foi obrigada a assinar sem ler. Será que nesse país as coisas funcionam assim? Estão aqui a retirar as coisas da minha irmã a força porque querem fechar a casa”.

E questiona, igualmente, o comportamento da concunhada da viúva que reivindica o espaço após o desaparecimento físico do seu cunhado. 

“Só hoje, depois do esposo dela perder a vida, é que vem revindicar? Não estou a perceber o que está a acontecer, apenas cheguei e encontrei esses carros que estão a carregar os bens dela, para onde ela vai eu não sei”.

Como ficam os inquilinos da viúva?

Para garantir o seu auto-sustento, a viúva decidiu arrendar uma das casas  entretanto, a mesma revelou que foi decidido pelo tribunal que as casas deverão ser trancadas, mas que, no entanto, o valor pago pelos inquilinos deverá ser canalizado para a conta da sua concunhada. 

A equipa do Ikweli contactou a única filha da viúva que se encontra a residir no distrito de Gurué, na província da Zambézia, que revelou que a sua mãe é desempregada, depende apenas de uma pequena barraca onde vende tomate, cebola, bem como do valor de uma das casas que está em aluguer e questiona, “como ela vai viver nesta situação, estão a lhe tirar até o valor que os inquilinos pagam por uma das casas, é complicado. Eu só quero saber como é o tribunal admite isso”.

“Minha mãe juntou-se com o meu padrasto quando eu tinha dois anos, ali só tinha uma cabana, meus pais juntos conseguiram construir três casas melhoradas ali. Meu pai perdeu a vida e minha mãe colocou uma das casas em aluguer para poder sobreviver, mas agora estão a dizer que o valor de renda deve passar para a conta da outra parte, porquê? Tinham dito que as casas seriam vendidas e minha mãe teria direito de 60% e a outra parte 40%, mas não é isso que está a acontecer é triste”.

A equipa do Ikweli tentou ouvir os supostos agentes do tribunal, mas estes remeteram-nos a 2ª secção para obter mais esclarecimentos do caso. Enquanto isso, Maria Afonso está a ser forçada a sair da casa que construiu com o seu parceiro, sem saber o que fazer, pelo que pede apoio das autoridades para a resolução do problema que enfrenta. (Ângela da Fonseca)

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