Nampula (IKWELI) – Na campanha agrícola 2023/24 as famílias produtoras na província de Nampula, no norte de Moçambique, foram colhidas de surpresa por uma doença que impiedosamente afectou vastas áreas da cultura de amendoim e, como consequência, os níveis de produção daquela oleaginosa baixaram drasticamente.
Na província de Nampula, a semelhança de outros cantos de Moçambique, o amendoim tem representado um dos principais alimentos, podendo ser consumido fresco, seco, mesmo no estado cru, torrado, principal aliado da mandioca seca (cozida ou não), tempero para muitas verduras, (no caso das folhas de mandioqueira, folhas de abóbora, couve, entre outras), para além de existirem outras famílias que até temperam carne seca, peixe seco, e infinitos gostos. O amendoim, pelo menos, na província de Nampula, é frequentemente usado para se fazer os famosos e apetecíveis doces.
Com essas infinitas formas de usar o amendoim, sem dúvidas aquela oleaginosa tem jogado papel importante na luta pela redução da desnutrição que continua uma preocupação na província.
Por essa razão, a baixa produção do amendoim foi facilmente sentida em diversos cantos. Uns dos impactos para os principais consumidores foram os preços assustadores para a sua aquisição, chegando a custar até 150,00Mt (cento e cinquenta meticais) por cada quilograma daquele alimento.
Trata-se da roseta de amendoim, a doença que afectou a produção da cultura de amendoim na campanha agrícola 2023/24, uma patologia causada por um vírus transmitido pela picada de um tipo de insecto denominado afídio. A doença é de domínio técnico do sector agrário, mas desconhecida pelos produtores, principalmente os do sector familiar que não têm tido sequer acompanhamento dos técnicos extensionistas.
Por conta disso, a doença ficou conhecida no seio das famílias produtoras, em Nampula, como “repolho de amendoim”, dado o formato de repolho com que as folhas do amendoim ficam, após serem atacadas. Não é a primeira vez que isso acontece, mas na campanha finda, a situação ganhou contornos alarmantes, onde numa área semeada de 1ha (um hectare) não se conseguia tirar sequer 10kg (dez quilogramas) deamendoim.
“A produção de amendoim fracassou muito no ano passado, por causa de uma doença que chamamos de repolho, afectou muito as nossas machambas. Ninguém conseguiu tirar da machamba porque as folhas ficavam amarrotadas e não desenvolviam,” recorda Ferdinando Rafael, um produtor na comunidade de Rainha, distrito de Meconta.
“Esta doença aconteceu aqui na Rainha, assim como em todo o distrito de Meconta, mas no ano passado foi grave,” acrescentou a fonte.
Ferdinando Rafael faz parte de uma associação comunitária de produtores que têm a sorte de ser assistida por técnicos extensionistas afectos ao Serviço Distrital de Actividades Económicas de Meconta, mesmo assim a agremiação não escapou da fúria da roseta. Por conta disso, Rafael nem gostaria de recordar do episódio devastador que viveu na época passada, porque em 1ha a agremiação conseguiu tirar duas latas de 20 litros de amendoim, não descascado.
A presente campanha pode ser comprometida por falta de semente
A fraca produção do grão do amendoim no ano passado pode ter impactos nefastos na presente campanha, sobretudo nas famílias com fraco poder de compra. Em causa, está o facto de maior parte dos produtores do sector familiar não ter conseguido conservar o grão do amendoim para a safra em curso.
Inácio Augusto, por exemplo, é um residente na zona de Molôa, no posto Administrativo de Anchilo, distrito de Nampula. Ele contou que por conta do repolho que afectou a sua área de cultivo não conseguiu tirar o amendoim. Quando começou a presente campanha revelou não ter conseguido semente suficiente para cobrir sua porção, devido aos altos preços praticados pelos comerciantes locais.
“No ano passado fomos afectados por uma doença nesta nossa zona, o amendoim parecia repolho, naquele tempo de recolha você arrancava, mas nem um amendoim conseguia apanhar lá. Aquilo foi doloroso demais. Nesta zona nenhuma pessoa conseguiu tirar o amendoim, a não ser um senhor que vinha da cidade que tirou, pelo menos dois sacos, talvez por sorte,” referiu.
“Este ano, apesar desta chuva que constantemente cai, não consegui semear muitas áreas porque não tive semente suficiente. No mercado era normal encontrar eles a vender 100,00Mt (cem meticais), 120,00Mt (cento e vinte meticais), 150,00Mt (cento e cinquenta meticais), até alguns lugares 200,00Mt (duzentos meticais). Então, como tenho falta de dinheiro, acabei não semeando como eu queria,” acrescentou, lamentando Inácio Augusto que disse desconhecer as reais causas do repolho no amendoim.
“Aquilo foi triste, todo amendoim ninguém aproveitou porque era normal toda machamba ter repolho. Mas este ano parece que alguma coisa está mudando, pelo menos nesse tempo em que estamos, já não sei lá onde vamos. Quando vemos as plantas nos enganam um pouco. O problema agora é a falta de semente, por isso apenas consegui semear pouco só para as crianças comerem,” referiu Gildo, outro morador deAnchilo.
A roseta de amendoim, também, não deu tréguas em algumas áreas de produção do distrito de Mogovolas. Apesar da variedade “Nametil”, espécie de amendoim mais usada naquela parcela e os demais pontos da província, descrita como resistente a doença, no ano passado cedeu a pressão da patologia, afectando assim na quantidade e qualidade do grau daquela oleaginosa, segundo atestam os moradores locais. Aliás, segundo as fontes, mesmo na presente campanha há registo da roseta em algumas áreas de cultivo.
“No ano passado tivemos esse problema de repolho, mas algumas pessoas conseguiram produzir, mas outras não tiveram sucesso. Mas este ano a situação está grave, nenhuma machamba que você vê e diz vale a pena, mesmo aquelas pessoas que semearam na primeira chuva, ninguém está bem”, relata com preocupação Názimo Omar, residente na zona de Namakharu, bairro A, no posto administrativo de Nametil, sede do distrito de Mogovolas.
A mesma preocupação, também, foi manifestada por Castelo Rufino, um produtor do sector familiar no povoado de Mukukuni, em Nametil. “Nada vai bem na parte do amendoim, nas machambas só tem repolho. Estamos mal e desesperados, não acredito que alguém consiga pelo menos uma tigela, por causa desserepolho. No ano passado as pessoas que semearam cedo conseguiram o amendoim, mas aquelas pessoas que semearam tarde não tiveram nada, porque era repolho e se arrancasse a planta, era normal conseguir um amendoim,” frisou a fonte.
O distrito de Rapale não foi uma excepção. Alguns produtores locais lembram-se com preocupação o sucedido.
“Não consegui amendoim no ano passado, por causa do repolho. Aquilo desmoralizou muitas pessoas. Quando começou a chover este ano quis semear, mas apenas consegui um quilograma, porque estava muito caro,” anotou António Mário.
O problema é conhecido pelas entidades governamentais, mas há pouca difusão da mensagem para as famílias camponesas
A demora na sementeira, estiagem, a falta de rotação de culturas, não consociação, a inobservância de outras técnicas de maneio, está na origem da roseta do amendoim (repolho). Este é um conhecimento partilhado em quase todas instituições governamentais abordadas durante a realização desta, mas há sinais inequívocos de que as mesmas desvalorizaram a doença ao não difundir para as comunidades, tal como acontece quando há eclosão de doenças diarreicas, ou mesmo quando eclodiu a covid-19 em que através das mensagens emitidas pelas instituições governamentais, via órgãos de comunicação social, por exemplo.
No portal do governo, por exemplo, existe um manual, designado “Manual do Amendoim”, publicado em 2015, o qual traz um leque de informações desde selecção e preparação de solos até a comercialização, elaborado por Amade Muitia, do Instituto de Investigação Agrária de Moçambique (IIAM). Mas a informação contida no referido manual não está à disposição do pacato camponês.
Meconta perde 50% da produção

Fora do manual, os Serviços Distritais de Actividades Económicas, durante este trabalho mostraram que sabem do assunto. Por essa alegada desvalorização daquela doença calma, mas mortífera, os governos distritais e provinciais viram suas cifras afectadas.
No caso concreto do distrito de Meconta, um dos grandes potenciais na produção do amendoim, na província de Nampula, as suas metas de produção ficaram afectadas pela doença em 50%, ao conseguir produzir pouco mais de 14.000t (catorze mil toneladas) contra cerca de 30.000t (trinta mil toneladas) planificadas.
“Durante a monitoria que fizemos aos campos, junto de supervisores, técnicos e outros intervenientes, verificou-se o ataque da cultura de amendoim pela doença da roseta. Dizer que esta doença da roseta é provocada por um vírus que são insectos pequenos, que se alimentam da seiva da planta do amendoim tornando esta seca e com folhas amareladas. Esta doença é frequente nos campos em que a sementeira é feita tardiamente, e que também tem problema de chuvas, quando são irregulares”, explicou Sónia de Araújo, directora do Serviço Distrital de Actividades Económica de Meconta.
“Na produção de amendoim [na campanha 2023/24] nós tínhamos um plano de 28.768 toneladas e tivemos como produção real, 14.049 toneladas. Nesta cultura, tivemos cerca 14.719 toneladas perdidas, praticamente cerca de 50%, isso devido a este problema de estiagem e ataque da doença da roseta no amendoim,” referiu a timoneira do sector de produção, em Meconta.
Igualmente, a produção do amendoim em Meconta foi em baixa na campanha 2023/24 em relação na época 2022/23 em que aquele território produziu 28.045 toneladas. “E fazendo uma comparação em relação ao mesmo período, nós tivemos um cumprimento na ordem de 49%. Então, para dizer mesmo que tivemos uma produção perdida nesta cultura,” acrescentou a fonte.
Para reverter o cenário, Sónia de Araújo alegou que “uma vez detectada esta doença, as medidas foram tomadas pelos extensionistas para combater esta doença da roseta na cultura do amendoim. As medidas foram de remover as plantas infectadas e queimá-las para que não infectasse as outras. Espalhar cinza sobre as partes infectadas das plantas para poder combater a doença, pulverizar com água e sabão e sensibilização aos produtores na rotação da cultura, isso para dizer que não podemos no mesmo campo estar a pôr a mesma cultura todos os anos,” disse.
SDAE de Mogovolas não assume a roseta, mas admite que a qualidade do grão do amendoim foi afectada

Apesar de parte dos produtores do sector familiar em Mogovolas olhar com preocupação a situação do repolho do amendoim, o director de Serviços Distritais de Actividades Económicas daquela parcela disse não ter registado a doença.
Entretanto, reconhece que a vagem (invólucro do grão) não teve o desenvolvimento desejado, afectando assim na qualidade do próprio amendoim.
“Em relação a cultura de amendoim na campanha 2023/24, em termos de produção, tivemos uma produção boa, podemos assim dizer porque não tivemos nenhum registo de problemas de doenças e pragas embora tivemos a redução do desenvolvimento da vage por causa de chuva. Mas em termos de produção, em termos de sanidade não tivemos problemas de pragas e doenças, na cultura do amendoim. No geral podemos dizer que ao nível do distrito não tivemos problema de doença em todas as culturas,” disse Isoscelino Draiva, director do SDAE de Mogovolas.
No ano passado, em conformidade com a fonte, Mogovolas teve um plano de produção de 12.701 toneladas, tendo sido obtida uma produção de 15.137, numa área de 9.334 hectares. Na campanha 2022/23 a produção real foi de 11.375 toneladas.
“Felizmente, no distrito de Mogovolas não fomos afectados por essa doença da roseta, não tivemos o registo de termos encontrado uma planta que tivesse sido atacada com essa situação, no nosso distrito, felizmente. Em relação a essa doença, temos sim o histórico, afectou, mas foi nas produções anteriores, digamos que nestas duas campanhas felizmente não tivemos a roseta.
Mas, que segredo Mogovolas tem?
“Não temos nenhum segredo, mas é um controlo que houve, porque essa doença é mais frequente nas épocas em que há problemas de chuva, mas nestas duas épocas felizmente há queda tardia, mas depois volta a cair regularmente. Então, sabendo que nessas épocas aí pode propiciar o desenvolvimento das pragas por causa da queda tardia das chuvas, então é nesse sentido,” respondeu Draiva a questão acima.
Para a presente campanha Mogovolas prevê produzir um universo de 16.335 toneladas de amendoim numa área de 12.143 hectares.
As cooperativas ressentiram-se da baixa produção e produtividade no amendoim- AMPCM

Por conta da roseta, os produtores da Associação Moçambicana de Promoção do Cooperativismo Moderno (AMPCM), delegação regional norte somaram baixas na produção da cultura de amendoim na campanha passada.
Em conformidade com Natalino José Barnete, coordenador Regional Norte da AMPCM, antes do ano passado as cooperativas comercializavam em média 3500 toneladas de amendoim. Em relação ao passado as estatísticas caíram, ao serem comercializadas cerca de 2500 toneladas daquela cultura.
“As cooperativas ressentiram-se da baixa produção e produtividade no amendoim. Houve um decréscimo no volume de produção do amendoim comparativamente aos outros anos. Geralmente as cooperativas comercializam em cada época 3000 toneladas de amendoim, nos últimos três anos a tendência tem sido essa, 3000, 3500 toneladas de amendoim e no ano passado as cooperativas produziram aproximadamente 2500 toneladas e isto deve-se a vários problemas que aconteceram ao longo do processo de produção e um dos principais que notamos foi o da roseta”, contou Natalino Barnete.
“Então, aconteceu isto, alguns produtores conseguiram e outros não conseguiram e aqueles que tiveram muitos problemas são os produtores que fizeram a sementeira um pouco tardia e tudo isso foi devido a irregularidade de chuvas. Em algumas zonas choveu cedo e noutras tardiamente. Ali onde choveu um pouco tarde houve maior incidência deste problema de roseta em que o amendoim germina, vai-se desenvolvendo e depois de algum tempo ele começa a encolher-se e fica parecido com repolho. Então, este problema afectou grande parte dos nossos produtores e teve impacto no volume de produção”, disse lamentando a fonte.
Para Barnete, não é muito fácil combater a roseta, pois basta atacar o amendoim não há outra forma de poder resolver, sendo que a retirada da planta afectada é a solução. “Então, todos produtores que tiveram aquele problema perderam os seus campos e foi em número maior. Portanto, como disse, a baixa produção do amendoim nas nossas cooperativas, de 3500 toneladas para 2500 toneladas, derivou mesmo por conta dessa roseta, irregularidade de chuva, assim como a qualidade de semente porque nem todos os produtores conseguiram semente certificada, e outros acabaram usando mesmo o grão e tudo isso contribuiu para o decréscimo da produção no ano passado,” referiu a fonte.
A falta de poder de compra da semente certificada por parte dos produtores, aliada à sua fraca disponibilidade no mercado, constituem outros factores que propiciaram no ataque da cultura do amendoim nas machambas do produtor na campanha agrícola passada, no entender do coordenador regional da AMPCM.
“O primeiro problema para não conseguirem a semente é mesmo o poder de compra, os produtores não têm recursos suficientes, não têm dinheiro para comprar a semente para as áreas de produção que têm, mas outro elemento é que há dificuldade na disponibilização de semente de qualidade real. Dos acontecimentos que temos estado a verificar nos últimos momentos é que há muita comercialização de grão, como se fosse semente, então esse é um problema muito sério porque não se produz semente de verdade e suficiente para todos os produtores, o que faz com que alguns provedores possam vender grão no lugar de semente. A semente tem padrão para a sua produção, ao invés de usar a semente e usar o grão, então não se pode esperar muito em termo do potencial da produtividade do amendoim por hectare,” entende Natalino.
A boa nova da AMPCM
Nos próximos tempos, a cultura do amendoim pode se tornar numa das principais fontes de renda para os produtores, sobretudo membros da AMPCM, com a entrada em funcionamento de uma fábrica que será responsável pela compra daquela oleaginosa para, posteriormente vender no mercado europeu, segundo garantias de Natalino Barnete.
“A fábrica já está em funcionamento e neste momento está em processo de certificação porque vai vender também para fora do país, para além do mercado nacional. É uma fábrica que tem vários donos, parte deles são as cooperativas. Então, eles vão produzir e vão vender acrescentando valor vendendo no mercado que vai pagar melhor”, prosseguiu o nosso interlocutor.
“Neste momento estamos no processo de certificação orgânica para todos esses produtores. Podem não sere todos, mas uma parte, começamos com 2500 produtores que estão a ter certificados orgânicos pela Ecocert e esperamos que até Junho, esses produtores estejam certificados assim como a própria fábrica possa ser certificada e, dessa forma, poderá vender a sua produção no mercado mais exigente e que paga bem”, antevê a fonte.
O Tivemos uma perda do amendoim de cerca de 15%

O Serviço Provincial de Actividades Económicas (SPAE)de Nampula disse ter registado com preocupação a eclosão da roseta de amendoim que na campanha passada afectou drasticamente a cultura.
Na campanha passada a província de Nampula tinha meta de produzir 371.875 toneladas da cultura de amendoim. Por conta da roseta, as expectativas ficaram defraudadas ao ser conseguida uma produção de 365.875 toneladas. São dados politicamente verdadeiros. Aliás este pode ser mais uma causa que levou ao Instituto Nacional de Estatísticas (INE) avançar para o censo agropecuário para aferir a veracidade dos dados constantes nos relatórios das entidades governamentais.
Dados tabelados ao lado, o engenheiro Joaquim Tomás, então chefe do departamento de Agricultura no SPAE de Nampula, estima que a roseta provocou um impacto negativo de, pelo menos, 15% da produção. Para dizer que, com esta percentagem de Joaquim Tomás, Nampula teve uma perda de mais de 55 toneladas do seu plano de produção.
“A cultura de amendoim é uma das principais da nossa província, em termos de geração de renda. Ela é produzida em quase todos os distritos da nossa província, mas com maior incidência aos distritos que estão localizados na zona intermédia, com pouca produção para os distritos com solo um pouco pesado, estamos a falar dos distritos de Malema, uma parte do distrito de Ribáuè, contudo nesses todos distritos existe esta produção”, contextualizou o engenheiro Joaquim Tomás.
“De facto, o sector agrário notou com grande preocupação a proliferação da doença roseta na cultura do amendoim que quase todos distritos se verificam esta doença. Quando verificamos esta doença entramos em contacto com a própria comunidade, com os próprios produtores para perceber como é que a doença se manifestava no campo. Nós notamos que, de facto, muitos produtores não compram a semente melhorada, eles armazenam a semente que produzem e semeiam quase todos os anos uma semente que já vinham semeando desde há bastante tempo. Então, o que aconselhamos a comunidade é que deve apostar na semente certificada porque a semente ao longo do tempo vai-se degenerando, perde aquela resistência a algumas doenças. Verificamos de facto que, em termos de produção, a roseta reduz a qualidade do próprio grão e ao mesmo tempo reduz a produtividade do amendoim”, prosseguiu o engenheiro agrónomo.
Segundo acrescentou a fonte, “ao nível da nossa província tivemos uma perda do amendoim de cerca de 15%, porque quando a doença ataca principalmente quando se descobre tarde, é difícil o seu controlo, mas quando estiver na sua fase inicial faz-se o controlo do vector da doença, estamos a falar dos pulgões, das lagartas, aí podemos usar pesticidas orgânicos para eliminar esses vectores. Também devemos fazer a rotação de culturas, porque tem aqueles produtores que põem o amendoim todos os anos no mesmo sítio, isso cria sensibilidades do aparecimento de vectores que provocam a doença. Então, o que aconselhamos mais aos produtores é fazerem a rotação de culturas, também a consociação, que é juntar culturas diferentes, a roseta pode não se desenvolver”.
Falta de sementes para responder a demanda

Salva Inácio Somueque, coordenadora regional da Unidade de Semente Básica (USEBA) no IIAM, disse que a roseta de amendoim impactou negativamente na acessibilidade do grão daquela oleaginosa e, consequentemente não conseguiu atender com a maior procura pela semente.
A USEBA é responsável pela produção da semente e distribuição para as empresas de semente certificada, mesmo sem avançar com dados quantitativos sobre os níveis de produção da semente, no ano passado.
“Dizer que na área de semente, sim, tivemos algumas diferenças e no ano passado é que já se fez sentir mais, mas vínhamos tendo há três campanhas, 2021, 2022 e 2023 este problema que assolou mais a cultura do amendoim, o da roseta. Nós, como investigação,estamos a trabalhar nisso para ver como podemos trazer algumas tecnologias que minimizem este problema, uma delas que nós constatamos é que os produtores fazem o uso repetitivo da semente. Se nesta campanha eu tive problema da roseta, é aconselhável que na outra campanha a semente seja descartada, usa-se nova semente, nesse caso os produtores teriam que adquirir nova semente que se garanta semente sã e sadia e semear em período recomendado da sementeira,” referiu Salva Somueque.
“A outra coisa que os produtores também não fazem e estamos a tentar trazer para eles é a questão do tratamento preventivo, os produtores apenas semeiam o amendoim e deixam a sorte, mas com esses problemas que assolam a província o certo seria semear e fazer controlos preventivos para tentar controlar o afídio que é o causador deste problema, deste mal da roseta,” anotou.
“Então, nós como IIAM, no sector de multiplicação da semente, sentimos sim esta diferença, sentimos sim este fluxo da própria semente do amendoim porque mesmo nós não conseguimos responder a demanda por falta da semente porque a procura era grande e nós não conseguimos responder a procura do próprio mercado, porque o próprio produtor que tinha lá algum grão é esse que ele perdeu por não ter seguido essas recomendações que estamos a dar a ele,” reconheceu a engenheira.
Além da roseta, a falta de fundos também tem afectado a multiplicação de sementes em quantidades para atender a crescente procura.
“Não temos tantos fundos para fazermos em quantidades, então o máximo temos tido até 2,5 toneladas, mas isso falado em semente, é muita semente, é diferente de grão. Existindo as condições financeiras, também a outra coisa que gostaríamos que acontecesse, é a questão de planificação conjunta com as empresas. Graças a Deus a partir desta campanha já estamos a fazer alguma conexão com algumas empresas ao nível da província para ver se podemos ter ajuda a tentar responder esta demanda que a província tem, porque o IIAM só não consegue fazer cobertura. O que nós produzirmos, para as empresas e elas serem responsáveis pela multiplicação da semente para os produtores, porque os produtores por si só não vêm adquirir a semente directamente no IIAM, isto porque o fluxo do sistema tem que vir investigação, vai para empresas depois para os produtores. Antes nós é que distribuíamos aos produtores, mas fomos ver que não conseguíamos controlar o fluxo da nossa semente,” entende a nossa interlocutora.
São necessárias medidas de contenção e mitigação da doença

O Instituto de Investigação Agrária de Moçambique (IIAM), delegação regional Norte, reconhece a existência e os prejuízos provocados pela roseta de amendoim, uma doença que não é nova, mas que na campanha passada teve impactos devastadores.
Para conter a doença, António Chamuene, delegado Regional Norte do Instituto de Investigação Agrária de Moçambique, disse que é necessário que os produtores invistam nas medidas de contenção e mitigação daquele mal. A fonte destaca, por exemplo, o uso de sementes certificadas, rotação de culturas, consociação, bem como a permanente monitoria e observação no campo de produção.
“Quando o afídio suga a seiva na folha do amendoim está a extrair nitrogénio, azoto, principais elementos para a constituição do seu organismo, estou a falar dos afídios que são pragas. Ao se alimentar de planta proveniente de outra espécie com patógenos causa doença e obstrui o sistema de circulação da planta causando doença por bloqueio do seu funcionamento normal devido a alteração deste crescimento não há formação de vagens do amendoim, que são flores atrofiadas que ficam no solo e formam logo a semente. Então, é a causa principal da perda da produção, a falta de produção do amendoim por causa da infecção do vírus no amendoim alterando seu crescimento normal, produzindo mais folhas e não o grão do amendoim,” começou por explicar o delegado regional Norte do IIAM.
Sobre as medidas de contenção e mitigação da doença, Chamuene explicou que “primeiro é preciso usar variedades tolerantes como JL24, Nametil, que são tolerantes a infecção do vírus. Também é preciso fazer o controlo do vector, nesse caso o afídio, um insecto pequeno e ele se alimenta da seiva da planta e nesse processo de se alimentar, ao infectar a planta o vírus propaga-se na planta e causa alterações no seu crescimento normal, daí baixa a produção da planta.”
“É preciso usar variedades tolerantes ou resistentes ao vírus que causa a roseta do amendoim. Para isso, também é preciso usar inseticidas, aqueles usados para controlar sugadores da seiva. Esses insecticidasquando são aplicados, principalmente, na fase vegetativa pode conter a ocorrência da doença, uma ou duas aplicações são suficientes,” prosseguiu explicando a fonte.
Por outro lado, Chamuene recordou que a ocorrência de doenças e pragas no geral tem sido desafio na actualidade, devido a mudanças climáticas, destacando a temperatura e humidade, razões principais para ocorrência de doenças e pragas nos campos de produção.
“Os insectos dependem do meio ambiente para o seu desenvolvimento, principalmente a temperatura e humidade. Altas temperaturas, acima de 35 graus os insectos não sobrevivem, mas na faixa de 20 a 35 graus centígrados é o momento de ocorrência de pragas. No caso de doenças, quando há excesso de humidade, então favorece a ocorrência de doenças fúngicas, principalmente. Então o nível de risco depende do regime de precipitação e da temperatura em determinado local, varia de campanha para campanha,” disse.
“É preciso fazer monitoria, visita ao campo e observar os sinais logo no início, essas todas espécies a fase inicial pode ser ninfa ou pode ser lagartas. Nos primeiros dias é a fase em que as pragas devem ser controladas. Quando nós vimos que no campo já tem danos, a praga já está grande, por isso a importância de treinamento em maneio integrado às pragas um pacote de observações com medidas concretas a serem tomadas na fase inicial que as pragas começam a ocorrer,” frisou o engenheiro agrónomo.
Não basta dar informação, são precisos recursos para treinar as comunidades
O delegado regional Norte do IIAM acredita que um treinamento das comunidades sobre técnicas básicas de controlo e mitigação das pragas e doenças, poderia ajudar para que o pior não acontecesse nas machambas do camponês, numa altura em que não existem técnicos extensionistas para fazer assistência a todos os produtores do país e da província.
A fonte sublinhou a existência de investigadores com conhecimentos necessários para ajudar as comunidades na melhoria da sua produção, mas a falta de recursos financeiros constitui problema central para que esse desejo não se efective.
“Essa tarefa foi incumbida ao Ministério da Agricultura, Ambiente e Pesca, e o sector agrário tem a parte de investigação como o nosso caso, e tem a parte de extensão Agrária, para assistência aos produtores. Portanto, a questão que me coloca é preciso investimento, as tecnologias já existem, esse conhecimento é de domínio de todo pesquisador, mas é preciso que vá às comunidades. Para tal é preciso envolver rede de extensão, fazer treinamento práticos em campo, não apenas distribuir a informação. A adopção de tecnologias só é possível através de visibilidade e benefícios. Quando o produtor ver o efeito, a diferença em campo ele consegue rapidamente aceitar e adoptar a tecnologia,” referiu Chamuene.
“Precisa de investimento, eu me lembro no passado em que todo produtor tinha assistência de extensionista que trabalhava directamente com o IIAM. A transferência de tecnologias faz-se através de acções concretas, através de campos de demonstrações de extensão e investigação ao nível dos distritos,” recordou.
No que concerne às variedades do amendoim mais usadas no país e na província, Chamwene destaca Nametil, mamã, mothithela, JL24, mamane, por sinal as tolerantes a pragas e doenças no campo.
“Portanto, o IIAM tem esse material, mas não distribui directamente aos produtores, fazemos a semente da primeira geração que é a semente usada para empresas de produção de sementes para semente certificada. Portanto, a semente que sai da investigação é de qualidade, mas é para efeitos de multiplicação através de certificadores de sementes que geralmente são empresas e associações. E essas variedades que eu disse, por exemplo mamane tem um rendimento médio, quando todas as condições são favoráveis, cerca de 3 toneladas por hectare, Nametil tem 1.5 toneladas por hectare, mothithela 2 toneladas por hectare, JL24 2,5 toneladas por hectare,” revelou
Para a fonte, “é uma oportunidade porque alguns vão ao mercado, compram o grão e dizem que é semente, mas o que está no mercado não é semente, é grão e não tem pureza, o desenvolvimento da planta não é a mesma quando nós compramos semente que vem no IIAM e passa pelas empresas e é certificada,” rematou a fonte. (Constantino Henriques)