Homens estão sendo cada vez mais violentados em Moçambique 

Nampula (IKWELI) – A Organização Mundial da Saúde, (OMS), define a violência como o uso intencional da força física ou do poder, sob a forma de acto ou ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, contra um grupo ou comunidade, que cause ou tenha muitas probabilidades de causar lesões, morte, danos psicológicos, perturbações do desenvolvimento ou privação. 

Em Moçambique, casos de homens vítimas de qualquer tipo de violência denunciados às autoridades policiais eram até algum tempo atrás quase que inexistentes, e as causas são de vária ordem, como o medo de não ser levado a sério, desigualdades sociais e culturais, falta de apoio e recursos. 

Mas, a situação tende a mudar nos tempos mais recentes. Dados do Gabinete de Atendimento a Família e Menor Vítima de Violência (GAFMVV) do comando geral da polícia da República de Moçambique (PRM), revelam que só no primeiro semestre do presente ano, foram encontrados em todo o país, 48 corpos de homens sem vida com sinais de agressão física, queimaduras, supondo-se que os autores sejam mulheres, facto que resulta num aumento em 21% quando comparado com o mesmo período do ano passado.

A responsável daquele gabinete, Mariza Nhacuongue, disse ao Ikweli que as províncias de Nampula, Maputo e Sofala, é que demonstram representatividade em todas as regiões do país, e um facto preocupante para a entidade é a suposta prevalência de discriminação no atendimento dos homens vítimas de violência, em detrimento das mulheres, o que aumenta a “espiral do silêncio” das vítimas em denunciar casos.

A nível da província de Nampula, o mesmo gabinete, declara que pelo menos 4 homens morreram no primeiro semestre deste ano, vítimas de violência doméstica, contra 15 do mesmo período do ano passado. 

E a chefe da Repartição de Atendimento a Violência no GAFMVV, Ilda António Ferreira conta que os números acima ilustrados constituem um ganho, pois demonstram que, “Agora os homens denunciam casos de violência doméstica, antes eles tinham vergonham e receio de denunciar, e as mulheres nos últimos tempos estão a ser muito agressivas com os seus maridos, sobretudo na violência psicológica, liberdade sexual, patrimonial e agressão física, esses são casos que dão mais entrada.”

O “adeus” dos filhos aos pais!

A coragem dos homens vai além de apenas denunciar junto das autoridades policiais, a comunicação social tem também reportado diversos casos de homens vítimas de violência doméstica, mas que infelizmente vieram a ser óbito. 

A título de exemplo, um homem foi vítima de violência doméstica no passado dia 19 de Junho do ano em curso na província de Maputo, o mesmo sofreu queimaduras graves, as quais posteriormente terão posto fim a sua vida. Testemunhas no local revelaram que a agressora, por sinal amante do malogrado, teria usado óleo quente e após ter alcançado seu objetivo, colocou-se em fuga, sendo que até ao momento não se sabe do seu paradeiro. 

Ainda na província de Maputo, no município da Matola, também foi assistido outro caso de homicídio agravado, supostamente protagonizado por uma mulher, que terá desferido vários golpes na cabeça do seu marido com recurso a uma garrafa, até a morte. Testemunhas no local do ocorrido contaram a imprensa que era hábito agredir o parceiro. 

A indiciada por sua vez, diz não saber explicar porque agrediu o marido, e no momento está arrependida. 

Já na província Nampula, um homem de 30 anos de idade foi encontrado sem vida na residência de sua ex-esposa, no bairro Mutauanha, posto administrativo de Muatala.

O caso ocorreu no passado mês de Julho, e terá deixado um grande vazio junto ao filhos do falecido que também passam dificuldades para se alimentar. Questionada sobre as razões que a levaram a praticar o acto, a suposta assassina julga que o ex-marido já vinha padecendo de uma doença, e que o incidente só veio selar o inevitável.

O irmão mais velho do malogrado, Rosário Fulo, manifestou preocupação com o ocorrido e relatou que o irmão estava desaparecido há 4 dias, e mesmo tendo procurado saber junto aos seus amigos mais próximos, não foi possível localizá-lo.

A irmã do malogrado diz ter chamado sua ex-cunhada no sentido de perceber a causa que levou a morte do seu irmão dentro da sua residência, e teve a resposta de que teriam encontrado o corpo sem vida no chão.

Outro caso chocante foi o de um homem assassinado por sua esposa com recurso a um martelo no bairro de Napipine, posto administrativo com o mesmo nome, arredores da cidade de Nampula. Falando à imprensa, a suposta assassina diz que praticou o acto porque o marido não provia assistência familiar. 

Segundo informações colhidas no local, o malogrado deixa seis crianças com idades que variam de 7 a 13 anos de idade que hoje vivem o castigo de não ter o que comer, um preço gerado pela violência doméstica. 

“Matei meu marido porque não queria deixar comida em casa, sabendo que teve comigo cerca de 6 filhos, com idades que variam entre 7 à 13 anos, mas sempre que ele conseguisse dinheiro, ia dar outra esposa e eu com os meus filhos éramos vítimas de violência, sempre tínhamos que receber porrada quase todos os dias, por cansar quis me defender e defender meus filhos, foi quando entrei, levei um objecto, mas não sabia que era martelo, bati uma vez na cabeça dele e perdeu a vida. Agora assim estou arrependida, porque não sei quem vai ajudar-me com aquelas crianças, apesar de que ele não deixava nada, os meus filhos conseguiam chamar ele de pai.”

Entre as vítimas, há sobreviventes!

Um dos sobreviventes é Abílio José, de 31 anos de idade, que foi dos poucos que denunciou a violência sofrida há por mais de três anos às mãos da sua esposa, pessoa com quem continua a partilhar o teto. 

Abílio José conta na primeira pessoa, “Minha esposa não me respeita, sempre diz que vai a casa da mãe todas as manhãs e volta fora da hora, por volta das 22 horas enquanto está embriagada, alegando que estava a vender, mas vai se encontrar com outros homens usando o corpo dela em troca de dinheiro, quando consultei sempre dizia que os valores eram da mãe, mas nada muda,” contou a vítima. 

Rosa Manuel de 25 anos de idade, natural da cidade de Nampula, indiciada de violar psicologicamente e fisicamente o marido de 31 anos de idade, confirma a situação, e conta que tudo começou depois do seu marido tê-la abandonado com uma criança de dois meses sem garantir nenhuma assistência. 

“Sim chego tarde em casa, mas porque vendo cabanga (bebida tradicional) na casa da minha mãe, mas passei a vendar porque ele não deixava comida em casa e depois de ele me abandonar há dois meses, sem nenhum motivo mesmo sabendo que tem uma filha menor de idade, foi casar outra mulher, e são três mulheres que ele casou fora de mim, para sustentar a minha filha é graças a minha família e vizinhos que davam comida. Mas quando volta para minha casa, sempre que eu volto tarde em casa me batia, por isso fizemos chegar até as autoridades competentes”.

A acusada, acrescentou ainda que, “eu nunca vou deixar de beber sim, porque não sei o que lhe fez ele deixar de beber, e do meu lado ainda não chegou essa vontade. Talvez com o andar do tempo, uma vez que já estou viciada e estou há 4 anos, e não me arrependo, ele pode ir embora já não lhe quero mais, só quero que ele assuma a criança, porque também é dele.”

É necessário tratamento psíquico para as vítimas e autores!

O psicólogo educativo da direcção Provincial de Género, Criança e Acção Social (DPGCAS), em Nampula, Óscar João Titos, explicou que é importante que as vítimas participem de palestras juntamente com as agressoras. 

“É uma questão que nos preocupa e temos dado apoio psicossocial a todo grupo alvo, sendo que de Janeiro à Junho tivemos 9 casos de homens vítimas de violência física grave que foram queimados pelas mulheres, contra 3 de igual período do ano passado. Temos feito palestras e sensibilizações para criar uma harmonia social quer nos homens, tanto na mulher e criança, aumentar o nível da denúncia, desmistificando informações de que o homem não pode denunciar.”

Por sua vez, Armando Gombe, psicólogo clínico no Hospital Central de Nampula (HCN), maior unidade sanitária da região norte do país (Nampula), entende que a violência doméstica que resulta em morte protagonizada por mulheres é preocupante devido a ações violentas feitas nos últimos anos por homens.

“Sabemos que a violência doméstica é bastante activa no seio da sociedade e que as mulheres já praticam violência contra homens porque estão saturadas, uma vez que elas pediram socorro, mas nunca são consideradas, e os homens que são vítimas de violência não conseguem denunciar por causa das normas de que o homem deve ser forte.”

O psicólogo aponta agentes da PRM como os que acabam perpetuando a violência devido a falta de preparo, “Os agentes da polícia não tiveram boa preparação para lidar com casos de violência durante a formação, eles também podem estar a contribuir, porque têm uma tendência de querer julgar as vítimas, sobretudo os homens, então isso faz com que não denunciem, por exemplo, no primeiro trimestre de 2025 tivemos registo de 2 casos, contra 4 de igual período do ano passado, mas isso só porque os homens não denunciam e como consequência gera frustração, depressão, e consumo de bebidas alcoólicas excessivamente.” (Virgínia Emília)

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