Eleições gerais 2024: Manifestações pós-votação mancham o processo nas cidades de Nampula e Nacala

Nampula (IKWELI) – A província de Nampula é a mais populosa do país e, por conta disso, tornou-se no maior círculo eleitoral de Moçambique com mais de três milhões de eleitores inscritos para o escrutínio realizado no passado dia 09 de Outubro do corrente mês. 

O processo eleitoral, em Moçambique, nomeadamente, campanha, votação e pós votação normalmente são acompanhados por confrontos violentos causados pelo cruzamento entre caravanas dos partidos políticos e as cidades de Nampula e Nacala têm tido relatos de focos de violência que culminam em ferimentos graves e mortes, uma situação que muitas vezes envolve a polícia, violando assim aquilo que são os direitos humanos. 

Na cidade de Nampula foram inscritos: 531.909, tendo votado 192,052 e 333.857 não foram votar, perfazendo uma percentagem de 62,77%. Nacala-porto por sua vez, inscreveu 193.795 eleitores, tendo votado 72.905 eleitores com uma abstenção de 120.890, o que corresponde a 68,3%.

Em ambos locais, a taxa de abstenções é elevada, mas ligeiramente maior em Nacala, com 68,3% do que Nampula que houve 62,77% de abstenções. O que indica que a diferença percentual de abstenções entre as duas cidades é de 5,53 %.  

Comparativamente com o ano 2023, aquando das eleições autárquicas, Nacala inscreveu 12.893, deste número, votaram apenas 3.694, o que representa uma taxa de participação de 28,7% e uma abstenção de 9.199 que equivale a 71,3%, ou seja, Nacala registou uma redução de 3% quando comparado com o presente ano. 

Sugere-se que factores locais podem ter contribuído para essa variação, sobretudo a acessibilidade aos locais de votação e o engajamento dos eleitores nas campanhas.

Já a cidade de Nampula inscreveu no ano transacto 163.312 eleitores, tendo todos eles afluído as urnas, contudo, houve apenas 159.217 votos válidos correspondentes a 96.32%, visto que 2.134 foram votos em branco correspondentes a 1.29%, e 3.961votos nulos, o que corresponde a 2.39%.

Antes disso, o dia da votação foi antecedido por 43 dias longos de campanha eleitoral, processo que arrancou no passado dia 24 de agosto tendo terminado dois dias antes do sufrágio. Foram 43 dias de “caça” ao voto em que os representantes dos partidos políticos “venderam” suas propostas de governação.

Confrontos físicos e incidências de violência física entre apoiantes de diferentes partidos foram os principais acontecimentos partilhados pela polícia, sem registo de mortes.

Actos de violência 

Grupo de manifestantes do partido Podemos na cidade de Nampula

De acordo com o Comando provincial da Polícia da República de Moçambique (PRM), em Nampula, durante os 43 dias de campanha no presente ano, ao todo, Nampula registou 38 feridos dos quais 10 graves e 28 ligeiros, sendo que desses casos 16 foram só na cidade capital, sem registo de detenções. Ao passo que na cidade portuária de Nacala não houve registos de violência, detenções ou feridos em consequência da campanha eleitoral, tal como ilustra o gráfico abaixo.

No dia da votação, foram detidas 5 pessoas, das quais 4 na cidade de Nampula e um no distrito de Nacala, por actos de enchimento de urnas e um dos casos culminou em violência em Nacala. 

Após o processo de votação, o ambiente vivido nessas duas cidades era considerado calmo, visto que nas primeiras semanas não houve registo de violência, apesar de descontentamentos por parte de alguns líderes de partidos políticos que contestavam os resultados preliminares divulgados pelos órgãos distritais e provinciais.

 

Uma das vítimas ferida nas manifestações do Podemos

No entanto, a cidade de Nampula registou uma manifestação no dia da chegada de Venâncio Mondlane, do partido PODEMOS, ambos colocados como os segundos mais votados, nestas eleições. A agitação culminou com 12 detenções e 4 feridos, em consequência de baleamento por parte de agentes da PRM a alguns membros do partido PODEMOS.

Já no dia 21, segunda-feira, foram convocadas à escala nacional manifestações pacíficas, cujo teor era reivindicar o assassinato do advogado de Venâncio Mondlane, Elvino Dias e o mandatário do partido PODEMOS, Paulo Guambe, ocorrido na madrugada de sábado (19), em Maputo. Por conta das manifestações, a PRM diz ter registado 18 detenções sem registo de feridos. 

As detenções verificaram-se ainda nas manifestações do dia 24 de outubro, onde a província registou um óbito por baleamento durante um confronto entre manifestantes e a polícia, onde foram detidas 24 pessoas, sendo 16 na cidade de Nampula e 8 em Nacala. Ainda em Nacala, o hospital local recebeu 5 feridos, sendo um deles agente policial que foi brutalmente espancado pela população.

Informações colhidas pelo Ikweli, indicam que o processo eleitoral de 2023, neste caso, as eleições autárquicas foram marcadas por cenários de extrema violência eleitoral nos locais acima mencionados entre a polícia e os manifestantes que contestavam os resultados, houve relato de uso de força excessiva por parte das autoridades.

Dados estatísticos que o Ikweli teve acesso, indicam que nas eleições autárquicas de 2023 as cidades de Nampula e Nacala registaram actos de violência após o processo de votação, o que resultou em mortes e feridos. 

Em Nampula, um agente foi morto durante confrontos após manifestações contra os resultados e uma criança de 10 anos foi baleada pela polícia. Enquanto isso, em Nacala, um jovem morreu após ser atingido por um objecto durante confrontos no mercado central, tal como ilustra o gráfico.

Ao todo, de acordo com os dados partilhados pela PRM, na província de Nampula, 11 pessoas perderam a vida, incluindo três menores de idade.

As restantes províncias, também, foram palcos de vários incidentes de violência e intimidações durante o processo das eleições autárquicas de outubro, com reações violentas da polícia aos protestos dos apoiantes de partidos da oposição.

Enquanto isso, PRM e CPE avaliam positivamente o processo

A porta-voz da PRM no comando provincial de Nampula, Rosa Nilza Chaúque, fez um balanço positivo do sufrágio de 09 de outubro, justificando que apesar de alguns focos de violência na província, não houve registo de escaramuças quando comparado com o ano anterior.

“Podemos afirmar que o processo deste ano foi muito calmo, não tivemos muitos casos, sobretudo na cidade de Nacala, onde nos processos passados tivemos casos chocantes de violência. Acredito que os eleitores estão mais conscientes sobre a necessidade de se manterem calmos e serenos”. 

Uma opinião que é, igualmente, partilhada pelo presidente da Comissão Provincial de Eleições de Nampula (CPE), Daniel Ramos, que apesar de alguns casos registados na cidade, limitou-se em felicitar a PRM, bem como aos apoiantes e simpatizantes dos diversos partidos políticos, pelo facto de estes se absterem de actos de violência durante a campanha, votação e pós-votação nas cidades de Nampula e Nacala.

“O que notamos é que a campanha eleitoral foi feita de uma forma pacifica, festiva e porque nunca tivemos uma campanha saudável como desta vez, por isso achamos por bem agradecer a todos os intervenientes neste processo, a partir dos próprios partidos políticos, mesmo aquelas pessoas que estavam interessadas em manter a lei e ordem. Não acompanhamos nenhum incidente de alarme”.

Sociedade civil e partidos políticos avaliam o processo positivamente 

Apesar de não ter havido registos de violência extrema durante a campanha e votação nas cidades de Nampula e Nacala, a sociedade civil mostra-se preocupada, visto que o mesmo não pôde ser vislumbrado após o anúncio dos resultados preliminares.

O académico, Olindo Soca, explica que tal cenário sem registo de muitos casos de violência eleitoral durante a campanha e votação deveu-se ao facto de os membros e simpatizantes dos partidos políticos estarem mais conscientes sobre as consequências de um confronto.

“Nacala tem sido um centro muito conturbado, mas este ano a juventude mostrou que já está consciente, digamos que a educação cívica dos partidos contribuiu para tal feito. Lamentavelmente, aparece um e outro partido para incitar a violência, e são esses cenários todos que acompanhamos após o anúncio dos resultados preliminares.”

O líder religioso Albertino José avaliou positivamente o processo do presente ano, quando comparado com os anos anteriores, onde membros e simpatizantes dos partidos políticos têm entrado em actos de agressões físicas, confrontos com os agentes da PRM que, muitas vezes, culminam em feridos graves e mortes.

“Nos outros anos, depois das eleições era um caos. Este ano tivemos eleições visionárias e de grande intelectualidade. Acredito que a divisão que houve entre os membros de um determinado partido fez com que as pessoas ficassem mais conscientes e cada um passou a ouvir aquele que é o seu líder, e os que contribuíam para que houvesse divergência não tiveram campo”, disse.

No entanto, por forma a que não se tenha actos de violência após o anúncio dos resultados, o líder sugere que se crie uma equipa de pacificação por com vista a resolver todos os problemas que advirem do processo. “Para que Moçambique seja unido, coeso para o desenvolvimento, é preciso que aquele que tiver uma crítica não seja visto como um rebelde, porque aquele que é criticado acha que é um problema, precisamos levar os nossos valores reais. Se pararmos para pensar no nosso país, haverá campo para diálogo por forma a alcançar a verdade do que avançar para a violência, aí teremos pessoas inocentes machucadas e haverá muito oportunismo. Se nós usarmos a cabeça e não a força, vamos alcançar aquilo que são os objectivos do país”.

O líder comunitário do bairro de Namicopo, um dos bairros mais populosos da urbe e que nas eleições passadas registou actos de violência após o anúncio dos resultados, Francisco Ramos, afirmou que os jovens muitas vezes envolvem-se em actos de violência por conta da desinformação que é perpetuada por interesses políticos ou pessoais. “Moçambique é um Estado de direito soberano e temos que pautar por aquilo que são os princípios da lei, mas os jovens na nossa cidade, na nossa província e no nosso país, são movimentados por desinformação e isso gera muita violência. Mas este ano não tivemos muitos problemas”.

Manuel Morais, primeiro secretário do partido Frelimo no distrito de Nacala, comunga da mesma ideia de que as presentes eleições foram calmas, pelo facto de não ter havido registo de violência na campanha e votação. “Pensamos nós que foi mais calmo e mais sereno, o que estamos a perceber, é que afinal de contas a população não é assim tão violenta, ela é agitada ou coagida por aqueles que são os seus dirigentes. É verdade que houve muita abstinência, mas não podemos adiantar aquilo que foram os anseios das pessoas”.

Para o partido PODEMOS, através do seu delegado distrital, José Ali, houve manipulação dos resultados, foi o que levou as pessoas a saírem as ruas para manifestar. Uma situação que fez com que, segundo partilhou, levasse a detenção de cerca de 14 membros do partido que foram soltos mediante pagamento de uma caução de 20.000,00Mt (vinte mil meticais) por cada apoiante.

Entretanto, José Ali explica que um dos factores que contribuiu para que houvesse manifestações que culminaram em violência entre os manifestantes e os agentes da PRM está relacionado com a contestação dos resultados. “A cidade de Nampula, se formos a ver, é um dos maiores círculos eleitorais, assim como Nacala, sendo assim, eles controlam os seus votos, não querem ver o seu voto a ser usurpado e quando tiram resultados fora daquilo que era esperado gera violência”.

José Justifica que a CNE não age conforme a lei e isso contribui para que os cidadãos, igualmente, atropelem a lei. “Está a ser violado o direito de eleger e ser eleito”.

Esta fonte sugere que CNE seja despartidarizada e a polícia sirva apenas ao povo, para que nos próximos pleitos, as eleições sejam justas e transparentes sem actos de violência.

A nossa equipa de reportagem procurou ouvir os representantes dos partidos políticos da Renamo e MDM, mas sem sucesso. (Ângela Fonseca) 

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