Nampula (IKWELI) – De janeiro do corrente ano a esta parte, o Hospital Central de Nampula (HCN) atendeu 227 casos de violência sexual contra menores de idade, contra 224 do igual período do ano transacto.
Deste número, a Polícia da República de Moçambique (PRM), em Nampula, recebeu 183 denúncias, contra 107 do igual período de 2023. Esta situação faz com que as vítimas desistam de frequentar a escola.
Tomamos como exemplo uma menor de 10 anos de idade que foi abusada sexualmente pelo seu vizinho de 18 anos, no passado mês de julho, e os pais estão preocupados com o estado psicológico e físico da menor que desde a data dos factos, optou por isolar-se dos demais. O caso ocorreu no bairro de Mutauanha, nos arredores da cidade de Nampula.
O pai da menor, Fernando Alberto (nome fictício) disse ao Ikweli que tem sido difícil para a sua filha enfrentar a situação, visto que o ocorrido gerou traumas e esta apresenta comportamentos estranhos.
“Não está a ser nada fácil para minha filha, assim como para mim, eu e as irmãs tentamos distrair ela, mas não conseguimos. Mesmo para brincar como antes, já não brinca, pior ainda porque o jovem é nosso vizinho e está a circular de um lado para outro. Assim ela já não vai à escola, só quer ficar trancada no quarto da falecida mãe. As vezes fica com medo de ficar ao meu lado e do próprio irmão”, narra esta fonte.
Fernando conta ainda que por causa do estado da sua filha, foi obrigado a recorrer ao hospital psiquiátrico, pois “quando descobrimos que o estado dela está cada vez pior, levei ela para o hospital psiquiátrico para ver se conseguia voltar ao seu estado normal, mas até agora continua na mesma”.
Por não estar a conseguir seguir todas as recomendações do clínico no hospital psiquiátrico, o pai da menor conta que foi obrigado a recorrer ao curandeiro, onde terá recebido um diagnóstico insólito. “Não tinha a condição necessária para seguir com as orientações dadas pelo clínico, acabei levando para o curandeiro e me disseram que o homem que dormiu com a criança, tem um sangue com espíritos malignos, então esse espírito é que está a fazer com que ela não consiga brincar com ninguém e não se aproxime de ninguém”.
Ainda na ocasião, o pai da menor, deu a conhecer ao Ikweli que depois do sucedido, levou o problema as entidades competentes, mas estas não manifestam interesse em resolver o problema. “Depois disso acontecer, levei o caso ao posto policial, para ver se poderiam me ajudar, mas só dizem que o processo já está na procuradoria, mas desde o mês de Julho, não sei em que pé se encontra o processo”.

No HCN, o Ikweli conversou com o psicólogo clínico Armando Cumbe, o qual explicou a frequência assustadora com que menores vítimas de violência sexual dão entrada naquela unidade sanitária.
“Temos mulheres e crianças que constituem o grupo de maior risco de violência sexual, são essas que com maior frequência procuram os nossos serviços. São crianças com idade escolar, entre 10 a 14 anos. Sabemos que é uma idade de adolescência e são crianças que ainda não estão preparadas psicologicamente para manter a relação sexual, mas temos recebido crianças com essa idade, violadas por adultos e muitas das vezes têm sido pessoas mais próximas, como é o caso de vizinhos, professores, e familiares, como pais, tios, avós, padrastos até mesmo empregados domésticos, cunhados, irmãos, primos e acaba quebrando a alegria das crianças”, disse o psicólogo que apela um dialogo permanente entre pais e filhas, de forma que elas possam abrir-se mais quando sejam vítimas de qualquer tipo de violência.

Evaristo Gonçalves Muhano, presidente da Associação dos Médicos Tradicionais de Moçambique (AMETRAMO), em Nampula, comenta que membros da sua agremiação já enveredaram por comportamentos desta natureza, mas que têm sido combatidos.
“Em 2021, no bairro de Namicopo, um curandeiro violou sexualmente uma menor, alegadamente que estava a fazer tratamento tradicional, acabamos por entregar a polícia que era para ser trabalhado como deve ser, porque trabalhou fora da norma e admitimos que ele fosse responder no tribunal”, contou esta nossa fonte.

Através do Gabinete de Atendimento à Família e Menores Vítimas de Violência Domésticas, a Polícia da República de Moçambique (PRM) tem, com preocupação, recebido casos frequentes de violação sexual de menores na cidade de Nampula e no distrito de Mogovolas.
Adelina Luís, responsável do sector, disse ao Ikweli que “como forma de reduzir os casos, fazemos palestras e sensibilizamos as comunidades para que os pais e encarregados de educação denunciem qualquer caso que notarem. Temos um aumento de casos contra menores, porque os pais não estão a denunciar”. (Virgínia Emília)