Nampula (IKWELI) – As mulheres deslocadas pelo terrorismo na província de Cabo Delgado, actualmente acolhidas em centros e bairros da cidade de Nampula, tem se dedicado na promoção de acções de sensibilização sobre a Violência Baseada no Género (VBG). Vindas de um contexto de guerra, das suas terras natais sem o mínimo para a sobrevivência, incluindo filhos ou maridos mortos e/ou capturados pelos terroristas, as mulheres procuram erguer-se do trauma, sobretudo na província de Nampula, que recebeu mais de 60 mil pessoas.
O terrorismo deixou vários moçambicanos em situação de vulnerabilidade, em especial às mulheres, que sentiram duplamente essa vulnerabilidade. Além da fome, o desemprego, o desespero das suas zonas de origem, a Violência Baseada no Género (VBG) é outra problemática crescente, a que estas estão expostas. Apesar de viverem na condição de deslocadas, algumas mulheres vítimas dos ataques terroristas na província de Cabo Delgado, que se encontram acolhidas na cidade de Nampula, decidiram fazer diferente, contrariando todas as expectativas do cenário.
Este cenário, não ocorre pelo facto do fenómeno de deslocados ser novo na província de Nampula, até porque existe um centro de acolhimento de deslocados em Corrane e um de Refugiados de outros países africanos em guerra, contudo foi mesmo devido ao aumento dos níveis de descriminação da mulher, que no conceito matrilinear, que caracteriza boa parte da Região Norte de Moçambique, a mulher vem sendo vista como um ser socialmente fraco e por isso sujeito à vários tipos de Violência Baseada no Género (VBG).
Anastácia Simba, de 28 anos de idade, é deslocada, vinda da aldeia Ntchinga, distrito de Muidumbe, que chegou à cidade de Nampula em 2020. Ela diz que ser “deslocada” não a impede, como mulher, de contribuir para a educação e aumento de consciência das outras mulheres que ainda têm pouco ou nenhum domínio sobre questões relacionadas a violência doméstica e assédio sexual, por exemplo. Anastácia, é mãe de dois filhos e explicou que depois de ter beneficiado de uma formação em matéria de Violência Baseada no Género (VBG), organizada pela ActionAid Moçambique (organização não-governamental), passou a ser voluntária na disseminação do conhecimento nesta matéria para outras mulheres, incluindo às vítimas do terrorismo.
“Na verdade, para mim mudou muita coisa, porque eu não sabia de nada sobre violência doméstica, mas, depois da capacitação abri minha mente e aprendi muita coisa. Já sei diferenciar violência sexual, moral e física”, começou por dizer” Anastácia Simba sublinhando que “também ajudou muitas mulheres deslocadas no meu bairro, Namiepe, a perceberem com detalhes o que é a violência e procedimentos de denúncia às autoridades”.
Ela conta que durante esta actividade de mulher activista em VBG, marcou-lhe o facto de ter salvo uma outra Mulher deslocada de um casamento violento, que de forma recorrente sofria maus tratos por parte do seu marido, que além de maltrata-la, não prestava a devida assistência alimentar à família e a criança, em especial.
“Havia uma senhora deslocada que sofria violência doméstica por parte do marido, contudo quando o seu marido conheceu outra mulher fora da casa, começou a maltratar, insultar, espancar, todo tipo de desconsideração incluindo o facto de que não comprava comida, deixando ela com duas crianças de cinco e dois anos a passar fome. Viviam de qualquer maneira, então quando vi aquilo ali a acontecer, fui ter com ela, ela me contou tudo o que estava a acontecer e foi dai que aconselhei a ir denunciar ao líder, ou Secretário do bairro. Ela disse que tinha medo, então levei até no líder Carlitos, contei e ela contou tudo, foi dali que fez uma nota para esquadra, e lá foi notificado e finalmente a senhora regressou aos pais em Namialo antes que o pior acontecesse”.
Facto este que para ela foi bastante gratificante, pois as mulheres deslocadas passaram a entender a violência em diferentes aspectos “Constituiu uma mais valia sim, porque violência não é só de casais, pode ser na comunidade, nós somos deslocadas, sofremos muitas violências, moral, por causa das falas, porque no meu bairro diziam que nós não fugimos guerra mas sim fome, então ficávamos assim, mas com as palestras que eram para anfitriãs e deslocadas, ajudou e sabem onde ou a quem apresentar a queixa isso eu lhe garanto”.
Satisfação dos beneficiários
Fátima Francisco, de 35 anos, é outra deslocada, vinda do bairro 30 de Junho, na Mocímboa da praia, é residente no bairro unidade residencial Memória, na cidade de Nampula, admite que os ensinamentos que obteve de uma activista (como Anastácia), também deslocada de Muidumbe, mudaram seu modo de pensar e a sua vida “participei de palestras para mulheres deslocadas como eu e outras, sobre VBG. Isso mudou minha vida sim, porque a partir dessa altura comecei a ficar integrada na vida de Nampula, porque eu só ficava em casa, era casa-mercado, poço e prontos. Então quando fui envolvida comecei a esquecer algumas consequências, também percebi que, como mulher não posso admitir brincadeiras porque há homens que só abusam de qualquer maneira. Muitas mulheres deslocadas também passaram a entender que não podem aceitar namorar com aqueles que fazem listas em troca de apoio, porque nos aproveitam”.
Com sentimento de gratidão e satisfação, Fátima, julga que o conhecimento ajudou não só as deslocadas, mas as mulheres de Nampula, que tinham pouca ou nenhuma informação sobre a matéria, portanto, “não só contribuiu para deslocadas, mas, para muitas mulheres, sobretudo aquelas que sofriam violência. Agora, sabem onde se direccionar pois outras chegaram nos postos policiais porque não sabiam como começar, mas depois de fazermos as palestras passaram a saber onde queixar, e havia mesmo deslocadas que sofriam VBG, pelos maridos” que além de violentos, eram infiéis, como relata Fátima: “no processo de listas, eram pedidos números e esses depois ligavam a conquistar, mas como tivemos informações não aceitávamos”, avançou.
Na busca por mais histórias, a nossa equipa chegou até a zona residencial de Mutava-Rex, onde conversou com a dona Fátima Raul Ibraimo Aine, de 30 anos e mãe de três filhos, deslocada do bairro Unidade, na vila de Mocímboa da praia, também testemunhou o impacto que as palestras e sessões de capacitações sobre Violência baseada no género, ministradas por outras Mulheres deslocadas. “têm sido um momento ímpar de aprendizagem, nós gostamos dessas palestras porque não sabíamos nada sobre a VBG, há maridos que insultam, falam palavrões e no final ainda lhe precisa na cama, mesmo a mulher não estar preparada, enquanto lhe insultou ou lhe bateu, então pelo menos aí entendi que apesar de casada e sustentada por ele, não deve ser motivo de ser maltratada”.
No centro de acolhimento aos Deslocados de Corrane, distrito de Meconta, falamos com Saquina Anselmo, mãe de duas filhas, que frisou a importância das sessões e palestras, tendo admitido que as activistas têm ajudado no acesso a informação em vários aspectos sobre VBG, mecanismos de denúncia, mas também de saúde sexual e reprodutiva, tanto que devido a uma das palestras ministradas, aceitou aderir à um método de planeamento familiar.
“Costumo participar nessas palestras que são dadas aqui no centro, e falando sobre planeamento familiar, decidi adoptar um método, para garantir o espaçamento de nascimento. Essa coisa de nascer sem travão, primeiro estou sozinha aqui, com essas duas minhas filhas, de nove e quatro anos, isso está a me permitir cuidar bem delas. E não sou a única que costuma ir lá no centro de saúde. Também costumam falar de outras coisas, como por exemplo, não podemos aceitar ser conquistadas para receber comida aqui no centro, porque, esses responsáveis pela elaboração da lista gostam de fazer isso com as mulheres, as palestrantes nos informam para não aceitar essas coisas porque eles querem aproveitar-se. É difícil dizer queixar, mas as mulheres sabem que podem fazer isso”.
O Ponto Focal das organizações não governamentais no bairro Namicopo, Veloso Paulo Tomás, explicou que o Projecto de Apoio Psicossocial da ActionAid, formou entre 2021-2023, Quarenta (40) activistas sociais das quais trinta (30) deslocadas e dez (10) anfitriãs, numa perspectiva de inclusão das mulheres vítimas do terrorismo.
Veloso Paulo Tomás, lembrou que a inclusão surgiu porque “Inicialmente as mulheres deslocadas sobretudo as que chegaram sem maridos viveram momentos difíceis, até se metiam com qualquer homem porque precisavam de algum sustento elas pensavam que se não se meter com alguém não teriam uma vida com sucesso, olhando a vida da cidade, e só com envolvimento desse projectos como a OIM, INGD, e ActionAid, sobretudo antes de se distribuir a comida e apelavam que não poderiam dormir com alguém em troca de comida, então elas ficaram abertas, e quando seleccionamos algumas para este treino da ActionAid a coisa melhorou”, explicou o contexto de empoderamento das mulheres deslocadas.
O impacto no centro de Corrane
As mulheres vítimas de terrorismo acolhidas na província de Nampula, não só se destacam como activistas nos bairros na cidade, mas também no Centro de Acolhimento de Corrane, distrito de Meconta, onde vivem mais de seis mil pessoas deslocadas dos distritos de Cabo Delgado.
A nossa equipa de reportagem, conversou com Minga Sirage, jovem de 25 anos, também natural de Mocímboa da praia, bairro Nanduadua, que actualmente vive no centro de acolhimento de Corrane, desde 2020. Ela, conta que já beneficiou de várias capacitações em diversas matérias, em especial sobre VBG, promovidas por organizações não governamentais como, CEDES (Centro Ecuménico de Desenvolvimento Social), OIM (Organização Internacional de Migração) e PIRCOM (Plataforma Inter-religiosa de Comunicação para a Saúde).
Na base dos conhecimentos que adquiriu, Minga Sirage, sentiu-se na obrigação de transmitir às outras mulheres deslocadas naquele local, pois no seu entender é chegado o momento de consolidar a relação de ajuda mútua entre as mulheres.
Minga, conta que tem na sua lista de trabalho 30 mulheres com as quais interage regularmente sobre aspectos de planeamento familiar, saúde materno infantil, horta caseira, saúde básica (malária e nutrição e prevenção de diarreias) e Violência Baseada no Género.
A nossa interlocutora, disse sentir que as suas palestras estão a mudar a vida das mulheres com as quais mantém contacto “fiz intervenção de um caso no ano 2022, em que uma família aqui mesmo no centro, estava a aceitar uma união de uma menina de 16 anos com um jovem de 21 anos também deslocado. Nós fomos explicar a mãe que alegava que a dona queria, e falamos com a própria menina, ela admitiu e hoje está a estudar nona classe. Foi necessário accionar a Polícia da República de Moçambique, esta que interveio e o casamento não aconteceu. Foi mesmo até na casa dessa família, mas depois a família, sobretudo a mãe, entendeu que a filha era menor e que isso se tratava de uma união prematura”.
Minga Sirage, destacou que a sua maior satisfação está em poder contribuir na massificação de informações vitais para a prevenção e combate a VBG no meio das mulheres, sobre os mecanismos de denúncia, principalmente a casos de assédio sexual e abuso sexual em troca de apoio alimentar ou outro tipo de oportunidade como a indicação para uma formação de curta duração oferecida aos deslocados.
“Há situações em que as mulheres são informadas por aqueles que são indicados para procurar mulheres para pequenos trabalhos, formações, essas pequenas coisas, para poder namorar com eles, então as mulheres negam isso. Nenhuma mulher veio me dizer directamente, mas, nas nossas conversas informais, elas contam que situações em que alguém é dito, por exemplo, fazer a lista de 20 pessoas e como ele precisa sexualmente uma das mulheres, então ele quer aproveitar dizendo que não lhe escrevo até isso, quando é gratuito. Tenho três casos que ouvi nessas conversas a reclamar sobre esta situação e elas não aceitaram. É daqui onde fico satisfeita e entendo ou até posso dizer que as palestras estão a dar resultados, as mulheres não estão a se deixar levar por essas situações”.
Mãe deslocada salva filha de união prematura
Iniciativas do género motivam cada vez mais mulheres a se erguer em sua defesa e de outras Mulheres. Senhora Olinda Mussa, é outra “heroína”, deslocada do bairro Pamunda, em Mocímboa da praia, agora, também residente do centro de acolhimento de Corrane. Conta que participou de duas capacitações, uma do CEDES e outra da Plan-Internacional, nesta última sobre o planeamento familiar.
Na sua experiência de realização de palestras sobre VBG e com destaque para planeamento familiar e assédio sexual, Mussa, diz que ajudou muitas mulheres a escaparem de situações de assédio sexual e união prematura.
“Trabalhamos até 2023 com raparigas de 15 aos 17 anos, informando para não se deixar enganar em situações de assédio, encorajando eu com uma outra colega, a fazerem denúncia, igualmente, para não aceitar o casamento prematuro. Na verdade, tínhamos três grupos-alvos: adolescentes, mulheres adultas e crianças. Com essas de idade, também falamos do planeamento familiar, para fazer entender que precisam evitar gravidez para estudarem ou cuidar bem dos filhos”.
Tendo confessado igualmente que os conhecimentos a ajudaram a travar o “casamento” de sua filha, menor de 16 anos desde a sua chegada no centro em 2020 “Minha filha quase se casava aqui, mas, por causa dessas conversas com raparigas ela não engravidou e nem se casou quando estava aqui no centro, isso ajudou-me bastante”.
A jovem mulher, Ernestina Ernesto Machude, deslocada da aldeia Nhanga, distrito de Nangade, norte de Cabo Delgado em 2020, disse que trabalha como voluntária em Corrane, desde 2022, depois de beneficiar de uma formação da ActionAid Moçambique em Namialo. Actualmente, além de sessões de palestras no centro. interage e mentora à um grupo de 35 raparigas, das quais cinco são anfitriãs. Nesta jornada, Ernestina, além de proporcionar conhecimento e ferramentas para a vida às raparigas, diz sentir-se privilegiada por fazer parte da mudança positiva na vida das mulheres e raparigas. Tanto é que segundo conta, em Abril passado do corrente ano, recebeu uma mulher participante da sua palestra, que era constantemente vítima de violência física pelo marido.
“Quando regressamos da palestra e recreação, nem passou uma semana, chegou uma senhora com sinais de ferimentos na cara, ela disse que foi violentada pelo marido, então recorreu a mim. Achei impressionante, então dali, decidimos ir à polícia porque ela dizia que estava cansada de maus tratos, achando que o marido fazia aquilo porque estava sozinha apenas com as cinco crianças, por isso pediu para irmos lá na PRM para resolver o caso, assim, fizemos e o problema foi resolvido, o homem está enquadro, e senhora já vive sem violência ou ao menos sem muita violência, isso me marca até agora”, realçou.
As Mulheres provenientes de contexto conflituoso em Cabo Delgado estão mais preparadas para prevenir e combater VBG
Ernestina acredita que actualmente, as mulheres de Corrane estão mais preparadas e capacitadas para identificar quaisquer tipos de violência baseada no género, assédio sexual e Uniões prematuras, pois, “dentre muitos casos que tive conhecimento as mulheres negaram ceder perante alguém que pediu sexo em troca de inscrição para uma oportunidade. Por isso, considero que as mulheres estão informadas”, partilhou.
É de referir que no período da implementação das iniciativas de Apoio Psicossocial às mulheres vítimas do terrorismo em Cabo Delgado, acolhidas na província de Nampula, aconteceu numa altura em que de acordo com o Instituto Nacional de Gestão de Desastres (INGD) registava mais de 39 mil deslocados a nível da cidade de Nampula, dos pouco mais de 65 mil em toda a província.
As histórias de sucesso
De acordo com Veloso Paulo Tomás, Ponto Focal das organizações não governamentais no bairro Namicopo, o envolvimento das 30 activistas, mulheres deslocadas de Cabo Delgado, teve resultados inquestionáveis, tanto para as próprias deslocadas, como para as mulheres anfitriãs que participaram das palestras.
“Tivemos o caso de uma menina em Namiepe, que foi violentada pelo namorado por ter a encontrado pelo caminho parado com o irmão, então ele não se conteve pensou que era namorado, e bateu-ma, criando ferimentos e esses mulheres incluindo através de uma denúncia pública, foram até lá levaram até a unidade sanitária de Namiepe e depois levaram à Esquadra, a quinta e remeteram a queixa e foram solicitados os homens do SERNIC, fizeram o processo e foi até ao tribunal, a menina compareceu lá e foi julgado o caso, e teve que pagar multas estipulados pelo tribunal. O jovem em causa tinha 18 anos e a menina tinha 17 anos, isso foi uma agressão física que culminou com multa e prisão e o namoro terminou, e, ela ficou satisfeita tanto que pediu para entrar no grupo, isso foi graças a essas mulheres deslocadas” narrou.
Outra evidência do impacto das intervenções de formação e capacitação das mulheres e raparigas, foi relatada pelo ponto Focal das organizações em Namicopo, que conta a história de uma menina de 15 que estava determinada a unir-se maritalmente, mas após aconselhamento, mudou de ideia.
“Tivemos a história de uma menina de 15 anos em Namicopo, em que a própria estava a pedir aos pais para casar com um jovem de 21 anos que gostava, e isso embaraçou a mãe, então numa palestra orientada por aquele grupo, a mãe levanta e expõe a preocupação, em reacção, as activistas foram até na casa dessa família, conversaram com ela e percebendo dos conselhos, ela decidiu abandonar a relação e decidiu continuar os seus estudos na escola secundária de Namicopo e até hoje ela continua indo a escola, graças a estas mesmas deslocadas”.
A fonte, fala de outros aspectos positivos advindos das intervenções das activistas deslocadas dos ataques terroristas e apela para estas beneficiárias de diferentes projectos a continuarem a replicar os conhecimentos adquiridos, na suas respectivas comunidades mesmo que os mentores tenham encerrado as actividades ou regressado às suas zonas de origem.
Estes feitos, acontecem numa altura em que Moçambique é signatário de vários instrumentos regionais e internacionais para protecção da mulher e o seu envolvimento em acções de combate e resolução de conflitos, além de ter passado a membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, tendo em representação do país a ministra dos negócios estrangeiros e cooperação Verônica Macamo moderado o tema Mulher, Paz e Segurança em celebração de 23 anos da resolução 1325 que estabelece a necessidade de reflexão urgente sobre os efeitos dos conflitos em mulheres e raparigas.
O que diz o Governo
O Instituto Nacional de Gestão e Redução do Risco de Desastres (INGD) é a instituição pública que toma conta dos deslocados internos, provendo e coordenando a assistência humanitária.
A delegada do INGD na província de Nampula, Anacleta Botão, explica que “formamos uma equipa multi-sectorial, cada um com um cronograma, também tivemos a colaboração de algumas universidades aqui a nível da província”.
“Existem números que foram disponibilizados às mulheres para em caso de fazer a denúncia, porque temos conhecimento de casos em que homens tentam se aproveitar de raparigas, mulheres e adolescentes porque sabem que naquela casa existem e cada alegando sua desculpa, mas como estamos no terreno, temos uma equipa multi-sectorial que trata dos assuntos de violência baseada no Género. Uma vez que os casos reportados são encaminhados, tem de merecer a atenção de um psicólogo para que prontamente sejam atendidos. Se forem do hospital também serão prontamente encaminhados, assim como os da polícia. É diferente de não estar alguém de alguém que atende o que as senhoras passaram de lá ate cá. Mesmo para superar o trauma não está a ser fácil, mas hoje é notório ver no rosto delas um sorriso. Há dois anos não sorriam, mas hoje é o contrário e qualquer um que se aproxima delas é capaz de ver um sorriso no rosto das mulheres. Também provemos actividades culturais como forma de inseri-las. Na componente de VBG desde 2020 temos pelo menos nove (9) mil mulheres em toda província”.
Botão está ciente da existência de desafios, mas o mais importante é que “temos algumas parcerias a manter, o governo sozinho não consegue dar vazão, estamos a levar a cabo as actividades e fazemos monitorias permanentes, são monitorias planificadas, com instalação desse espaço seguro, garantimos que elas estejam livres de falar, e com os números e faz com que elas percam o medo e continuem a denunciar esses casos, é uma acção contínua, o INGD tem um sector para lidar questões baseadas na violência baseada no género, é uma acção contínua, não como parar porque está dentro do INGD, é uma das prioridades do INGD”.
“Com as condições de acolhimento criadas, nós pensamos que faltava o acompanhamento para questões de trauma, sabemos que cada um veio de seu lado com seu comportamento, numa situação de aglomerado sempre temos que prestar atenção a certos comportamentos e a questão de Violência, de oportunismo não faltam, então nós criamos mecanismos com os parceiros para mostrar as famílias qual é o normal e o que é fora do normal e em caso do fora do normal como elas devem se comportar ou como elas devem se comportar e, acima de tudo, o direito que tem como deslocados e por sua vez, fazer perceber que elas não estão sozinhas, o governo está ali, os parceiros estão ali, a província de Nampula no geral está com os deslocados tanto mais que foram acolhidas. Temos que reconhecer que a província de Nampula deu o pouco ou partilhou o que tinha logo que os deslocados chegaram na primeira instância, isso vale consciencializar as famílias que chegaram e por meio disso fomos criando condições junto dos parceiros onde as mulheres tinham espaço ou têm neste momento espaço, falo especificamente de Corrane onde há espaço, onde as mulheres encontram-se e expõem seus problemas onde num encontro normal são capazes de exteriorizar e lá contamos com psicológicos, que é uma equipa multi-sectorial incluindo também o pessoal que garante que haja registo das pessoas. Este trabalho foi feito e tem estado a ser feito porque é um trabalho contínuo, de lá para cá, garantimos a partir dessa sensibilização das mulheres, que as famílias tenham documentos de identificação”, recorda a nossa interlocutora.
Por outro lado, Anacleta Botão assegura que “foi criado um centro, que nós chamamos espaço seguro, onde elas se encontram, cada uma expõe o seu problema. Neste centro temos psicólogo, temos atendimento mais personalizado onde a pessoa precisa expor todo o seu problema, também temos linhas telefónicas em caso de a pessoa não querer ir para lá. Com uma chamada pode colocar a preocupação na condição de anonimato, bastando dizer onde e quando nós seguimos esses casos”.
Igualmente, “estamos a empoderar, estamos a mostrar a elas que são capazes, apesar de não estarem na província de origem aqui elas estão inseridas. O IFPELAC trabalhou na formação de 33 mulheres deslocadas em toda a província, em carpintaria, corte e costura, culinária, salão de cabeleireiro, e mereceram kits de assistência para começar o seu negócio”.
É preciso sensibilizar as pessoas
O sociólogo Jafar Silvestre Jafar disse a nossa reportagem ser necessário sensibilizar as pessoas para que não enveredarem por estas práticas de violação dos direitos das mulheres deslocadas.
“Antes das organizações darem o seu apoio nas mais variadas dimensões, eu acho que é preciso uma sensibilização, é preciso uma aula de sapiência, uma educação cívica aos senhores, os homens e os jovens, para que, de facto, tenham um engajamento maior e tenham um rendimento esperado na perspectiva dos beneficiários”, recomenda o estudioso.
Mas também, segundo aquela fonte, “na outra perspectiva é preciso que haja um acompanhamento, não só as organizações que financiam e que promovem as iniciativas, também o governo ao nível local precisa dar acompanhamento à essas iniciativas, fazer a monitoraria e avaliação, e depois vai verificar quais são os pontos fracos os pontos fortes para que sejam corrigidos os pontos fracos e as iniciativas tenham impacto desejado, então se faltam esses mecanismos, aquelas que são boas iniciativas bem concebidas depois de algum tempo não vão ter pernas para andar, portanto eu olho isso nessas duas dimensões”.
(Amade Abubacar)