Nampula (IKWELI) – Celebra-se anualmente a 3 de junho, o dia Mundial do Pé Boto, trata-se de uma má formação congénita que provoca alterações no pé e condiciona a mobilidade.
O tratamento existe, mas, muitas vezes, é ignorado, por conta disso, algumas mães, com crianças nessas condições, chamam atenção as outras no sentido de seguirem com o tratamento ainda nos primeiros meses de vida por forma a que tenha resultados satisfatórios o mais cedo possivel.
Olga é mãe de uma menina de apenas 1 ano e 10 meses que descobriu a condição da filha alguns meses após a nascença, isso porque participou num encontro em que os profissionais de saúde disseminavam informações sobre o assunto.
Sem pensar duas vezes e por coincidência do dia, Olga decidiu levar sua filha ao Hospital Central de Nampula (HCN) para seguir com o tratamento.
Visivelmente emocionada, a mãe da menor contou ao Ikweli que nunca teve o apoio do parceiro para o seguimento do caso, por isso, seu maior desejo é ver o problema da filha solucionado.
“Quando falei ao pai disse fica assim mesmo, porque Deus quis, mas eu me preocupei com a minha filha,porque futuramente ela poderá ver outras crianças a andarem bem e ela vai se sentir mal e eu como mãe vou ficar triste. Hoje estou aqui para tratar a minha filha”, conta.
Olga explicou que a pequena Sabina tem dificuldades até para ficar em pé, apesar disso, a menina brinca, “ela gatinha, brinca muito, mas quando tenta ficar em pé não aguenta”.
Lizete Marcelino dos Santos conta que descobriu a condição da pequena Molony nas primeiras horas de vida e logo de imediato seguiu com o tratamento, hoje, com 1 ano e 6 meses a menina apresenta um quadro acelerado de recuperação.
Na altura, a pequena Melony passou por processos “dolorosos no tratamento”, como uma cirurgia e colocação de gesso por um período de 21 dias.
“Foram fazendo massagem e constataram que a partir daquele momento já podia calçar as talas, e só as tirava para tomar banho e, enquanto isso ela foi mostrando resultados satisfatórios. Depois de um tempo, os profissionais notaram que a menina já podia calçar sapatos, mas de forma contrária, ou seja, do pé esquerdo no direito e do pé direito no esquerdo. Agora consigo ver que a minha filha está muito melhor que antes”.
Lizete revelou que nunca tinha ouvido falar do Pé torto, como é vulgarmente falado, mas que já teve a oportunidade de ver criâncas nessas condições, contudo, sempre achou que se tratava de algo feito, ʺfeitiçariaʺ.
Satisfeita com os resultados, a mãe da pequena Melony chama atenção as outras sobre a necessidade de prestar atenção nos bebés após a nascença, para que o mesmo possa ter um tratamento precocemente.
“Depois de eu sentir no pé da minha filha, senti que afinal existe local onde me direccionar e que dentro dele, posso melhorar a condição dos pés dela. Mães, nós é que somos o veículo dos nossos filhos, quando tiverem alguma crianca na família com este tipo de situacao não se alarmem, não comecem a pensar que é feitiço, não criem desavenças na família, apenas se dirijam ao hospital e aqui o bebé terá atendimento digno”.
Anabela de Castro é, igualmente, mãe de uma criânca que nasceu com o pé boto. Desde 2021 encontra-se a fazer o trataento da condição do menor, hoje, com três anos de idade.
Transferido do centro de saúde de Mogincual, o menor apresenta melhorias no tratamento, tal como explicou a mãe.
“Eu não esperava, mas hoje, estou a ver que meu filho já anda, hoje em dia ele coloca sapatos normais,mas de forma contrária e de noite depois do banho deve colocar as talas e dorme com elas”.
Por isso, é de opinião que as outras mães optem por encaminhar seus filhos a unidade sanitária, “quando virem que a situação do bebé não está boa, deve procurar saber como fazer o tratamento no hospital”.
Por outro lado, Júlia Alfredo revelou que, constatemente, a sua filha tem sido motivo de piada no bairro, isso porque a menor usa sapatos “talas” considerados “estranhos”, mas a mesma não se deixa levar, pois, compreende que os calçados servem para corrigir o problema do pé boto.
“Como mãe tento fazer o bem para minha filha ficar bem, um dia desses vai me dar oportunidade de ver ela a andar. As vezes outras mães lançam gargalhadas e dizem vejam só o que a filha usa nos pés, mas eu não me importo porque quero tratamento para minha filha”.
Só no primeiro trimestre HCN registou 20 casos de criânças com o pé boto
A responsável pelo tratamento do pé boto ao nível do Hospital Central de Nampula (HCN), Bethe Pinto Romão, fez saber que só no primeiro trimestre do presente ano, foram registados, pelo mesnos, 20 casos de crianças nessa condição, provenientes de vários distritos da provincia, com maior destaque para Monapo, Nacala, Ilha de Moçambique, bem como Gilé, Alto Molócuè e Mocuba, na provincia da Zambézia, centro do País.
“No ano passado, atendemos mais ou menos 60 crianças, algumas com melhorias e outras com recidivas. Recidivas são aquelas que depois não regressam para as vêm as nossas consultas de controlo, mas nós incentivamos sempre as mães para que venham para o bem-estar dos nossos filhos”.
Pinto Romão fez saber ainda que, actualmente, o HCN conta com um médico especialista que faz a identificação dos casos ainda cedo, isto é, durante a gravidez. No entanto, garantiu que as enfermeiras de saúde materno infantil estão capacitadadas para identificar a condição após o parto.
A responsavel pela área disse que, para o tratamento do pé boto recorre-se ao método Ponseti que usa uma série de moldes de gesso durante 21 semanas para corrigir a deformidade, imediatamente seguido por uso de talas usado durante 23 horas por dia, no periodo de três meses e, em seguida, usado apenas à noite até aos cinco anos.
ʺPara o tratamento adequado do pé boto são feitas correções semanais com gesso e, quando a correção é boa por exemplo na posição de varro, é feito a posterior uma tenotomia, que é uma cirurgia que se faz no tendão de Aquiles e passadas as três semanas a criança volta as nossas consultas para começar a colocar as nossas ortezes que vai calçar até aos cinco anosʺ.
Durante a entrevista, a fonte apelou a comunidade em geral que, ao identificar uma criânça com a condição de má formação congénita dos membros inferiores, sobretudo nos pés, encaminhar a unidade de referência, neste caso, HCN, para o devido tratamento.
A fonte chama atenção ainda, sobre as consequências que podem advir em casos de abandono do tratamento.
ʺBasta não calçar os sapatos o pé volta, por isso as mães devem sempre colocar as talas nos filhos. Se não tratada essa condição a criança é rejeitadaʺ.
Bethe Romão partilhou não haver uma causa conhecida para que a criânça nasça com o pé boto, ʺA causa é desconhecida, até hoje não se sabe o que é que provoca o pé botoʺ.
Em Mocambique, foi estabelecido e 2013 um plano denominado Programa Moçambicano do Pé boto (PMP), cujo os principais objectivos era de criar condições nas unidades sanitárias que permitissem o tratamento efectivo, acessível e apropriado à todas crianças nascidas com o Pé Boto. Também, oferecer formação aos profissionais de saúde e trabalhadores comunitários de saúde, de modo a que os casos de Pé Boto em crianças de tenra idade, sejam identificados e tratados adequadamente, com vista a eliminar essa condição que é considerada como causa de deficiência permanente no país. (Ângela da Fonseca)