Nampula: Famílias ainda procuram ultrapassar marcas da brutalidade policial

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A PRM nao quer brincadeiras na quadra festiva em Nampula

Nampula (IKWELI) – Atumane Saíde é um cidadão que perdeu o seu irmão vítima de baleamento da polícia, no dia 27 de outubro último, quando a cidade de Nampula experimentava momentos de terror por conta de manifestações pelos resultados eleitorais.

Segundo ele, o seu irmão que respondia pelo nome de Sabonete Saíde, de 27 anos de idade, não fazia parte da manifestação, ele foi morto por balas deliberadamente dispensadas por agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM). A vítima encontrava-se próximo da sua casa, no bairro de Namicopo, na cidade de Nampula, e tentava proteger um menor que estava na rua na altura em que a polícia chegou no seu bairro.

“O meu irmão foi atingido na barriga, a bala entrou de um lado e saiu do outro. Tentamos socorrer para o hospital, mas não houve sucesso, ele morreu no mesmo dia”, conta, tristemente, Atumane, afirmando que luta para que a polícia seja responsabilizada pelo assassinato do seu irmão, mas diz estar a ser difícil, pois não sabe aonde recorrer para ter a justiça que, embora não traga o seu irmão de volta, pode servir para que a polícia não trate as pessoas como deseja. “Eu já procurei advogados, já falei com o presidente dos advogados e me disseram para esperar que vão me contactar e até agora estou à espera”.

Sabonete em vida era pedreiro, pai de uma filha e deixou mulher grávida. Esta família dependia dele para sobreviver.

Atumane refere que “nós queremos justiça porque a polícia não é para matar pessoas, a polícia é para proteger o povo, trabalhar para defender o povo contra o mal, mas como a polícia deste país trabalha sem olhar quem é o povo, então nós queremos a justiça. Esse que baleou meu irmão nós queremos que seja responsabilizado, responder em tribunal. Nesse dia foram baleadas muitas pessoas, outros estão no hospital, mas meu irmão morreu e neste momento deixou uma grávida, então a polícia tem que assumir a responsabilidade a partir do comandante provincial até o geral devem ser responsabilizados porque deram a ordem para matarem o povo”.

Atipo Juma, de 14 anos, é outra vítima mortal da polícia. Ele foi baleado próximo a sua casa no bairro de Namicopo, quando se encontrava a brincava com os amigos.

Tal como contou o pai, quando soube do baleamento mortal do seu filho, o levou para casa, mas antes de organizar a cerimônia fúnebre, dirigiu-se 3ª Esquadra, a fim de denunciar que os agentes tinham morto o seu filho e a resposta que teve foi de que “podes ir enterrar o seu filho, depois vamos lhe ligar”.

E porque, segundo ele, o estado do seu filho não permitia o adiamento do funeral, Atipo foi enterrado na mesma sexta-feira.

“Nós não sabemos quem o matou, só sabemos que foi a polícia. Naquela sexta-feira, que foi baleado, chegou um dos amigos aqui em casa e nos disse que ele estava morto, a polícia tinha lhe baleado na área do Abudo Caramba, aqui mesmo no bairro. Não acreditamos, porque ele apenas tinha ido brincar como fazia sempre”, disse a sua avó que, sem dizer o seu nome, se emociona ao lembrar da situação e recorda que mesmo durante o enterro a polícia foi insensível e lançou gás lacrimogêneo para as pessoas quando iam ao cemitério enterrar os restos mortais do adolescente.

“Não havia condição de deixarmos o enterro para o dia seguinte, porque as tripas dele estavam fora, já tinham saído” disse Juma, pai da vítima.

Com o silêncio da polícia, a família de Atipo Juma disse não saber mais aonde recorrer para ter justiça pelo assassinato de seu filho, mas acredita na justiça divina.

O jurista Bogaio Nhancalaza, explica que no caso em que a bala tenha saído da polícia, o Estado deve ser responsabilizado pelos actos ilícitos praticados pelos seus agentes e/ou funcionários.

“Se apurar-se que na verdade bala que atingiu as pessoas veio de uma entidade que é a polícia, a polícia deve responder pelo acto, mas há procedimentos. Neste caso, em que há um crime primeiro deve se fazer uma queixa, e estamos a falar de homicídio, um crime público, em que a pessoa independente de ser ou não o ofendido pode apresentar a devida queixa as autoridades competentes”.

Bogaio explica, ainda, que se o ofendido não se sentir seguro em denunciar á polícia, uma vez que é a acusada, o ofendido pode denunciar junto do Ministério Público.

“Sendo um crime público, o Ministério Público, como   o guardião da legalidade, se receber uma participação deve dar seguimento independentemente de quem for”, concluiu o DR. Nhancalaza. (Adina Sualehe)

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