Nampula (IKWELI) – Os membros da Associação dos Médicos Tradicionais de Moçambique (AMETRAMO), em Nampula, queixam-se da falta de colaboração do sector de saúde no que diz respeito a transferência de doentes que não registam nenhum avanço na sua recuperação por forma a buscar tratamentos alternativos na medicina tradicional.
As queixas foram feitas na marcha alusiva ao 21º aniversário da Medicina Tradicional Africana, que se comemora este ano sob o lema “A contribuição da Medicina Tradicional para a Saúde Holística e o Bem-Estar de Todos”. Trata-se de um dia em que os médicos tradicionais reflectem em torno dos desafios no exercício da sua actividade.
De acordo com o presidente da AMETRAMO da região norte, Evaristo Gonçalves, os membros da agremiação tem cumprido o acordo feito entre as duas partes, que é o encaminhamento dos doentes para as unidades sanitárias quando estes sentem que esgotaram as capacidades para curar o paciente. No entanto, estes ressentem-se da falta de colaboração da saúde.
“Nós tivemos uma capacitação proporcionada pela direcção da Saúde e por vezes reconhecemos que certas doenças não temos como tratar e quando nos aparece um doente nessas condições encaminhamos ao posto de saúde mais próximo, mas os hospitais não fazem essas transferências, eles preferem ficar com o doente até morrer ao invés de mandar para a medicina tradicional”, lamentou.
Entretanto, o presidente da AMETRAMO reafirmou a colaboração com o sector da Saúde, com destaque para a transferência de pacientes e a mobilização social para a prevenção de doenças, bem como a promoção da Saúde. “Nós vamos continuar a mobilizar as pessoas para procurar fazer tratamentos na medicina convencional, porque sabemos que há doenças que a medicina tradicional não pode curar, então aconselhamos a eles sempre a não ficar em casa”.
Segundo Goncalves, a nível da região norte estão inscritos na associação cerca de 6.880 médicos da medicina tradicional.
A mesma queixa que é, igualmente, comprovada pela presidente da AMETRAMO a nível da província do Niassa, Ancha Ali, que na ocasião disse ao Ikweli que o sector de saúde não pode deixar que os doentes percam as suas vidas, “uma vez que existe uma parceria, nós achamos que devia haver essa colaboração, eles não podem deixar doentes dentro do hospital a morrer, pelo contrário devem procurar dar uma guia para que os doentes possam também receber tratamentos via medicina tradicional”.
A fonte acrescentou que desde o início da parceria, “o hospital nunca transferiu doentes, mas nós costumamos dar guia. Um outro ponto tem a ver com transporte, estamos a pedir carro para que possamos transferir os doentes de forma segura para as unidades sanitárias”, afirmou.
Ancha Ali afirmou que Niassa conta com 650 médicos tradicionais, sendo que no presente ano foram tratados 150 pacientes que padeciam de diversas doenças como, “DTS, tensão alta e borbulhas”.
Importa referir que o dia da Medicina Tradicional Africana foi instituído pela Organização Mundial da Saúde (OMS), para honrar o papel fundamental que os médicos tradicionais desempenham na saúde e no bem-estar de gerações e gerações de pessoas pelo continente.
Mas Governo reconhece papel da medicina tradicional
O sector da Saúde, na província de Nampula, considera que os médicos tradicionais desempenham um papel fundamental nos cuidados primários de saúde, por ser uma das primeiras portas de entrada na procura dos serviços de saúde.
As palavras são do director provincial de Saúde de Nampula, Fernando Mitano, o qual destaca o referenciamento de doentes pelos médicos tradicionais para as unidades sanitárias, facto que contribui no combate a patologias que apoquentam a população.
“Neste momento, a província de Nampula tem 8.525 praticantes de medicina tradicional, refira-se que este número estamos a falar daqueles que estão inscritos numa das três organizações, nós temos AMETRAMO, ARMO e ASCOMO, são as três organizações ligadas à medicina tradicional”, disse Mitano, que explica que deste número de médicos tradicionais, mais de três mil encaminharam doentes de HIV, malária, tuberculose e para os serviços de planeamento familiar nas unidades sanitárias.
“Foram 101 casos de HIV provenientes da referência desses médicos tradicionais, tivemos 149 suspeitas de malária também reencaminhados por estes praticantes da medicina tradicional e que depois foram confirmadas nas nossas unidades sanitárias, nós tivemos 504 casos de suspeita de tuberculose que depois fomos fazer análises e destas verificamos que 400 delas padeciam de tuberculose, também recebemos 800 mulheres enviadas para o planeamento familiar e o parto nas nossas unidades sanitárias”, disse o governante.
Segundo Mitano, este apoio dos médicos tradicionais é de extrema importância, porque contribui para a redução de mortes por várias doenças, incluindo a mortalidade materna infantil. Ainda assim, é desejo do sector que o número de referenciamento de pacientes de médicos tradicionais para os hospitais aumente.
Entretanto, apesar desta colaboração, o director províncial de Saúde em Nampula manifestou preocupação com o facto de ainda haver casos em que pacientes permanecem nas casas de médicos tradicionais e só chegam as unidades sanitárias em estado grave e alguns deles chegam a perder a vida.
Outra preocupação tem a ver com o facto de existir doentes que fazem dupla medicação a tradicional e convencional.
E para ultrapassar tal situação, aquele dirigente afirmou que o sector que dirige tem formado médicos tradicionais em sinais e sintomas de malária, cólera, tuberculose, HIV e Sida e diarreias, de modo que eles saibam identificar a doença e possam encaminhar aos hospitais. “É importante dizer que estes praticantes de medicina tradicional tem um papel importante na educação para a saúde das comunidades, um caso a destacar foi quando tivemos a eclosão da COVID-19, em que os praticantes da medicina tradicional tornaram-se os nossos grandes parceiros nas comunidades junto das lideranças comunitárias e nós tivemos grande sucesso na nossa província. Lembro que a nossa província foi declarada como a primeira a ter contaminação comunitária, mas nós conseguimos reverter esta situação o que foi em parte resultado do contributo dos praticantes da medicina tradicional”. (Adina Sualehe e Ângela da Fonseca)