Nova Iorque (IKWELI) – O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF, na sigla inglesa) aponta, em novo relatório publicado nesta terça-feira (28), que entre 2016 e 2020 foram registados, em média diária, 71 violações graves contra crianças em zonas de conflitos.
“Entre 2005 e 2020, as Nações Unidas verificaram mais de 266.000 violações graves contra crianças cometidas por partes em conflito em mais de 30 situações de conflito na África, Ásia, Oriente Médio e América Latina”, aponta o relatório do UNICEF.
Esta agência da ONU acredita que o número possa ser ainda maior, pois este “é uma fração das violações que se acredita terem ocorrido, pois as restrições de acesso e segurança, entre outras, e a vergonha, dor e medo que as crianças e familiares sobreviventes sofrem muitas vezes dificultam a notificação, documentação e verificação de violações graves contra crianças em situações de conflito armado”.
Intitulado “25 anos de crianças e conflitos armados: agindo para proteger crianças na guerra”, o relatório constatou que “entre 2005 e 2020 mais de 104.100 crianças foram confirmadas como mortas ou mutiladas em situações de conflito armado; mais de 93.000 crianças foram confirmadas como recrutadas e usadas pelas partes em conflito; pelo menos 25.700 crianças foram abduzidas pelas partes em conflito; as partes em conflito estupraram, casaram-se à força, exploraram sexualmente e cometeram outras formas graves de violência sexual contra pelo menos 14.200 crianças”.
Por outro lado, “as Nações Unidas verificaram mais de 13.900 incidentes de ataques contra escolas e hospitais e não menos de 14.900 incidentes de negação de acesso humanitário para crianças desde 2005”.
“Este relatório expõe, nos termos mais severos possíveis, o fracasso do mundo em proteger suas crianças de graves violações durante os tempos de conflito armado”, disse a Diretora Executiva do UNICEF, Catherine Russell, citado numa nota de imprensa da organização que dirige distribuída a partir de Nova Iorque.
Russel prossegue afirmando que “graves violações devastam crianças, famílias e comunidades – e rasgam o tecido da sociedade, tornando ainda mais difícil restaurar e manter a paz, a segurança e a estabilidade. Devemos nos recusar a aceitar violações contra crianças como um resultado inevitável da guerra”.
Com base em dezasseis anos de dados do Relatório Anual do Secretário-Geral sobre Crianças e Conflitos Armados, o relatório ilustra o impacto que os conflitos armados tiveram sobre as crianças, apresentando tendências de graves violações em todo o mundo e ao longo do tempo. O relatório examina como as informações sobre os padrões documentados de violações graves estão sendo usadas para responder às necessidades das crianças e como o envolvimento com as partes em conflito – atores estatais e não estatais – permite acabar com e prevenir violações graves.
“O número anual de violações verificadas aumentou gradualmente desde 2005, ultrapassando 20.000 em um ano pela primeira vez em 2014 e chegando a 26.425 em 2020. Entre 2016 e 2020, a média global diária de violações graves verificadas ficou em um alarmante 71 violações. O elevado número de violações observado nos últimos anos demonstra o impacto dramático que os conflitos armados – e as crises de proteção cada vez mais complexas e prolongadas – têm sobre as crianças”, lê-se no relatório, cujo conteúdo temos vindo a citar.
O relatório observa que muitas crianças sofrem mais de uma violação, aumentando sua vulnerabilidade. Por exemplo, o rapto é muitas vezes combinado com ou leva a outras violações, particularmente recrutamento e uso e violência sexual. Crianças – especialmente meninas – que foram sequestradas e/ou associadas a partes em conflito estão expostas a riscos elevados de violência sexual, incluindo estupro, exploração sexual e casamento forçado.
As violações são de todas as partes
O relatório constatou que graves violações contra crianças foram cometidas por todas as partes em conflito, Estados e atores não estatais. Entre 2016 e 2020, atores estatais – incluindo forças e coalizões nacionais e internacionais – foram responsáveis por pelo menos 26% de todas as violações. Em comparação, os atores não estatais foram responsáveis por cerca de 58% de todas as violações verificadas, ressaltando a importância do envolvimento de todas as partes em conflito, incluindo atores não estatais, para encerrar e prevenir significativamente as violações contra crianças.
A fim de reforçar a responsabilidade, as partes em conflito listadas no relatório anual do Secretário-Geral sobre crianças e conflitos armados desenvolvem e implementam Planos de Ação com ações específicas, concretas e com prazo determinado para estabelecer medidas sustentáveis para proteger as crianças do impacto do conflito, por isso “entre 2005 e 2021, um total de 37 Planos de Ação foram assinados pelas partes em conflito em 17 situações de conflito. Cerca de 70 por cento dos Planos de Acção foram assinados com actores não estatais, sendo os restantes 30 por cento assinados com actores estatais. O relatório apresenta vários exemplos que destacam o valor crítico e o impacto dos Planos de Ação em trazer mudanças positivas para as crianças, tanto no imediato quanto no longo prazo, bem como delinear desafios e obstáculos”.
O número cada vez maior de actores armados não estatais, o desenvolvimento e emprego de novos meios e métodos de guerra, o uso de artefactos explosivos improvisados e outras armas explosivas, particularmente em áreas povoadas, são apenas alguns dos muitos factores que contribuem para a criação de desafios sem precedentes para a proteção de crianças em situações de conflito armado. (Aunício da Silva)