Nampula (IKWELI) – Grande parte dos deslocados de guerra de Cabo Delgado que encontraram refúgio na província de Nampula são crianças, cuja maioria passam por momentos difíceis, incluindo a falta de alimentos.
Nesta quinzena da criança que se celebra, o Ikweli visitou várias crianças, desde o dia 1 de Junho, Dia Internacional da Criança, e o cenário que encontramos é, simplesmente, desolador.
Tanto nos centros de acolhimentos, assim como em residências de particulares, as crianças passaram sem se quer, um prato de comida, mesmo em dia especial, como o 1 de Junho.
Ancha Adriano, de 10 anos de idade, encontra-se refugiada na cidade de Nampula, concretamente no bairro de Nahene, onde na escola primária local frequenta a 2ª classe.
A menina sabe da existência da data, mas tristemente, em consequência da guerra já não pode celebrar condignamente a data nos últimos anos. “Esse ano eu não passei 1 de Junho, como as outras crianças, porque não tinha nada para comer e nem para vestir”, disse a menor, que prossegue afirmando que “estou aqui desde o ano passado. Eu vivia em Cabo Delgado, fugimos de lá por causa de luta [guerra], mas quando chegamos aqui não estamos a conseguir comer todos os dias. O meu pai diz que não tem dinheiro, e nós passamos fome. As vezes para nós comermos, a minha mãe faz papas de farinha de milho com sal ou ela ferve feijão cote sem nenhum acompanhante (arroz ou chima)”.
Diante disso, a menor Ancha não esconde que “estou a sentir muitas saudades da minha casa, porque lá eu não passava fome”.
O tio da menor, Selemane Mahando, diz que a vida que levam, como deslocados, não é das melhores, e quem mais sente isso são as mulheres e crianças. “Estou aqui desde o ano passado, sai de Mocímboa da Praia, estou a fugir guerra que está a ocorre la”.
O senhor Mahando diz “já não recebemos mais apoios do governo, a última vez que recebemos foi no mês de Outubro do ano 2021, e até então não estamos a ver nada sobre aquilo que é apoio do governo, só estamos a comer a maneira”, tanto que “a nossa maior dificuldade aqui na cidade é a alimentação”.
“Aqui onde estou a viver somos uma família de 13 membros, e a nossa casa é essa cabana que os manos estão a ver. Não é fácil viver longe de casa, porque aqui só estamos sentados e não temos nada o que fazer como era lá em Cabo Delgado”, comenta este nosso entrevistado, explicando que “para garantir alimentação dentro de casa, estou a fazer biscato (limpar machambas) e consigo 100,00Mt (Cem meticais) para papahi (peixe seco)”.
Entretanto…
A Rede de Comunicadores Amigos da Criança (RECAC), uma organização da sociedade civil que advoga a colocação dos assuntos ligados a criança no topo das agendas dos órgãos de comunicação social, considera a situação como sendo drástica.
Em relação a falta de alimentos, Aunício da Silva, ponto focal da RECAC em Nampula, diz que a situação piora ainda mais quando se trata de crianças em estado de vulnerabilidade.
“Não se trata especificamente do primeiro de Junho, o certo é que a criança sendo o maior interesse de toda a sociedade deve ter os seus direitos completamente cumpridos e um desses direitos é alimentação”, comenta a fonte, acrescentado que “sendo primeiro de Junho umo dia comemorativo, esta estatuição seria de todo agrado se todas as crianças, de todo mundo, tivessem uma refeição com um dia condigno. Infelizmente, não aconteceu com algumas crianças deslocadas pelo terrorismo em Cabo Delgado”.
A nossa fonte local da RECAC apela que “nós, como comunicadores, devemos continuar a trazer estas situações, estas realidades, à tona para que quem é de direito repare pelo cumprimento dos direitos destas crianças”. (Hermínio Raja)