Nampula: Acidentes de viação causaram mais de 50 óbitos em 9 meses

Nampula (IKWELI) – Durante os primeiros nove meses do corrente ano, pelo menos, cinquenta e duas (52) pessoas perderam a vida nas diferentes estradas da província de Nampula, vítimas de acidentes de viação.

Este número de óbitos consta dos dados da Polícia da República de Moçambique (P.R.M), através do ramo da Polícia de Trânsito (P.T), no comando provincial de Nampula, resultado de um registo feito entre os meses de Janeiro e Setembro do presente ano, onde embora reduzido o número de acidentes quando comparado com igual período do ano passado, ainda constitui preocupação às autoridades policiais.

O fenómeno é considerado como sendo um dos grandes problemas social e económico da região, ao se ter em conta das vítimas mortais que tem causado no seio das famílias.

Segundo a Polícia, a maioria dos acidentes são do tipo despiste e capotamento, choque entre carros, choque entre carro e motorizada, embate entre carro e objectos fixos, os quais são provocados por excesso de velocidade, condução em estado de embriagues, não observância das regras elementares de trânsito, ou então debilidade do ponto de vista mecânico dos automóveis.

Em torno disso, o Ikweli dirigiu-se ao Comando provincial da P.R.M, no departamento da Polícia de Trânsito, onde entendemos que acções estão a ser feitas com vista a reduzir o índice de sinistralidade, na região. Porém, há que se reinventar mais para o efeito, ao considerar o comportamento dos actores chaves, com destaque para os automobilistas e os agentes reguladores de trânsito.

“O trabalho da Polícia de Trânsito é de educar todo utente da via, fiscalizar e sancionar os infractores das regras de trânsito. Igualmente, nos postos de controle a polícia tem uma missão de fiscalizar todos os autocarros que saem e entram na província de Nampula”, explicou Salvador Isaquiel Demande, chefe da Secção de Instrução e Educação na Polícia de Trânsito.

Portanto, “em termos de sinistralidade na província de Nampula registamos, durante os nove meses do ano em curso, 36 acidentes de viação contra 56 de igual período do ano passado, que tiveram como consequências, 52 óbitos contra 74 do período comparado”, igualmente, “52 e 59 cidadãos ficaram grave e ligeiramente feridos, respectivamente, contra 51 e 43 do período comparado de 2020”, informou a fonte para depois referir que um número significativo de danos materiais avultados e ligeiros foram registados decorrentes dos acidentes em alusão.

No meio disso, Demande denunciou à nossa equipa sobre a existência frequente de violadores das regras de trânsito, o que contribui significativamente na ocorrência de sinistros. Contudo, “a pessoa está para educar, mas como último recurso é a responsabilização destes por via de aplicação de multas dependendo da infracção”.

Nesta que é a província mais populosa do país, a corporação mapeou os principais pontos onde ocorrem acidentes de viação, destacadamente na Estrada Nacional Número Um (EN1) na zona de Nacarôa, Netia (Monapo), Santa Filomena (Meconta), Cazuzo (distrito de Murrupula), Carrapira, no troço Rapale/Ribáuè, entre outras, sem deixar detrás, as avenidas de e ruas da cidade capital provincial.

Igualmente, a falta de uma escola de condução específica para motociclistas é apontada, pela nossa fonte, como sendo um dos factores que faz com que haja acidentes envolvendo automobilistas e motociclistas nesta parcela do país.

“Os motociclistas não têm nenhuma escola de formação, porque para conduzir um meio tem de passar de uma escola. Os que conduzem carros na sua maioria passam de uma escola, embora não obedeçam algumas regras de trânsito. Se tivesse uma escola de formação para estes poderíamos dizer alguma coisa contrária a esta, apenas agora temos a dizer que não têm conhecimento das regras de trânsito quando se fazem à via pública”, referiu.

A dor nas famílias

José Alberto Júnior é jornalista baseado na cidade de Nampula, a capital da mais populosa província do país. Júnior é uma das pessoas que não guarda boas lembranças quando se fala de sinistralidade, tampouco se atreve em aventuras de excesso de velocidade, superlotação nas viaturas e condução em estado de embriaguez por temer consequências advindas destas práticas.

Foi na manhã do dia 1 de Setembro de 2016 que Júnior, em companhia de seus colegas de trabalho fazia-se transportar numa viatura de marca Toyota Regius com destino para o distrito portuário de Nacala, para mais uma actividade de cobertura jornalística. Entretanto, chegados na zona de Carrapira, distrito de Monapo a viatura capotou, causando quatro óbitos, dentre os quais, três jornalistas e o motorista da viatura. E dos feridos graves nesse acidente, infelizmente, o nosso entrevistado não escapou.

“Falar do acidente ocorrido a 1 de Setembro as memórias continuam frescas nas nossas mentes, principalmente na minha, não guardo boas lembranças devido a forma em que o acidente aconteceu, apesar de que ainda estamos vivos e gozando, aparentemente de boa saúde. Mas eu, principalmente, não consigo apagar aquele sinistro”, recordou José Alberto Júnior, para quem ficou hospitalizado durante um mês na maior unidade sanitária da região norte, Hospital Central de Nampula, período em que ficou cerca de 10 dias inconsciente e a receber cuidados médicos intensivos.

“Em termos do ocorrido já não me recordo em detalhes, eu fiquei inconsciente no momento de tumultos, quando a viatura estava a virar não me recordo de nada”, referiu a vítima.

Um facto não menos importante que o nosso interlocutor destaca é o comportamento de algumas pessoas que acorrem ao local de acidente, que no lugar de prestar primeiros socorros, cingiram-se na recolha de bens materiais das vítimas, o que acelera a morte de quem sofreu o sinistro, no entender da fonte. Diante disso, exorta as pessoas a pautarem pelo civismo e ter um lado humano, de maneiras que seja valorizada e colocada em prioridade a vida humana.

Tal como Júnior, o Ikweli entrevistou Celestino Manuel que perdeu o seu pai no ano de 2000, na província de Cabo Delgado, vítima de acidente de viação ocorrido na região de Metoro, distrito de Ancuabe quando este dirigia-se ao distrito de Montepuez para mais uma missão de trabalho, naquela circunscrição geográfica.

Em entrevista, Celestino recorda que “falar de acidentes de viação não guardo boas recordações, é um assunto dramático que, por conta disso, perdi o meu pai em 2000. Ele ia em missão de serviço para Montepuez, quando chegaram na localidade de Metoro o carro capotou e, infelizmente, o meu pai foi o único que morreu no local, enquanto outros seus colegas contraíram ferimentos graves que levou alguns a amputar os seus membros superiores e inferiores, foi triste”.

O seu falecido pai que em vida respondia pelo nome de Manuel Reteva era militar, chefe de família e que representava um meio de sucesso na família. Contudo, o tempo escasseou-se para o senhor Reteve e morreu vítima de um acidente, facto que marcou a família até aos dias de hoje.

Celestino refere que quando ouve falar de um sinistro fica comovido pela situação, dada a sua fatalidade. Para este, o comportamento humano é essencial para se evitar a ocorrência de um acidente, para além da situação mecânica das viaturas, bem como a qualidade das vias de acesso que algumas não estão em condições, no seu entender.

“Nós podemos sim sensibilizar as pessoas, não exceder o limite de lotação, não conduzir em estado de embriaguez entre outras ideias, porém, quando estes entram na via não observam ou acatam as recomendações. Contudo, quando acontece acidente perde a vida alguém que era confiado na família, são sonhos perdidos, são crianças que podem perder a escola e muita coisa que pode ser considerada. Então, nunca é demais os condutores observarem as regras de trânsito”, lamentou.

Numa outra abordagem, a nossa fonte aponta a debilidade do sistema no acto da fiscalização, com maior destaque para os agentes reguladores de trânsito e avança que “há muita corrupção. Se a Polícia de Trânsito trabalhasse como deve ser, acredito que teríamos casos reduzidos porque estancar é que não, ao considerar também outros factores. Estariam a evitar sangue nas estradas, mas há muita corrupção”, exemplo disso é que “os transportadores inter-distritais quando se fazem aos seus destinos superam a lotação de passageiros, bem como a de carga, mas essa mesma viatura passa pelos vários controles que existem. Então a questão que se coloca é, o que é que acontece nesses controles para o automobilista junto do seu ajudante passar neles? Lá rola muita corrupção”.

Dados oficiais indicam o registo de 119 acidentes de viação em 2020, contra 121 do ano anterior 2019, o que representa uma redução de dois acidentes. Ou então, nos últimos cinco anos tende a reduzir o número de acidentes de viação em Nampula, ao passar de 283 em 2015 para 119 em 2020, ficando na quarta posição de sinistralidade rodoviária no país, depois de Maputo Cidade, Gaza e Maputo Província.

No contexto geral, o índice de gravidade de acidentes aumentou no país, no intervalo de 2018 a 2020, em cerca de 23,6% óbitos em cada 100 acidentes, facto que continua a preocupar as autoridades do governo e a sociedade civil.

A situação de acidentes de viação também preocupa ao Centro de Integridade Pública (CIP) que, em 2014, publicou resultados de uma pesquisa sobre a sinistralidade, no âmbito do jornalismo investigativo, tendo concluído que a corrupção na Polícia, no Instituto Nacional de Transportes Rodoviários (INATRO), nas escolas de condução, nos centros de exames médicos, na Polícia Municipal e nos centros de inspecções de veículos constitui um dos factores principais da si­nistralidade rodoviária em Moçambique. (Esmeraldo Boquisse)

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