Maputo (IKWELI) – O movimento político Nova Democracia (ND) considera que, em consequência dos ataques terroristas em alguns distritos de Cabo Delgado, metade da população daquela província encontra-se deslocada.
“Por muito tempo, dias, semanas, meses e anos, a situação da guerra contra o terrorismo no norte da província de Cabo Delgado, não só não tem progredido positivamente, como também, tem piorado notavelmente, tornando a vida das populações num verdadeiro inferno. Por outro lado, a guerra em Cabo Delgado representa uma séria ameaça a soberania e independência nacional”, refere o ND, liderado por Salomão Muchanga, em uma nota divulgada no fim de ontem, domingo (31 de Janeiro).
Um estudo sobre Resiliência Comunitária ao Extremismo Violento conduzido pelo Centro de Estudos Estratégicos Internacionais da Universidade Joaquim Chissano (CEEI) em coordenação com o Instituto Nacional de Estatística (INE), cujos resultados foram publicamente apresentados no dia 19 de Janeiro, vem confirmar que 49% da população de Cabo Delgado está actualmente deslocada, 2.5% das casas definidas para o estudo já não existem, 9.6% estão destruídas e, 22% desocupadas, sendo que em parte das 66% supostamente ocupadas não encontraram os residentes no momento da pesquisa.
O estudo refere que, apesar da “elevada cultura de medo político caracterizada pela autocensura em tópicos sensíveis”, a população oriunda maioritariamente de Mocímboa, Macomia, Quissanga, Mueda e Metuge mostra-se extremamente insatisfeita com a forma como as autoridades estão a lidar com a insurgência, desconfiantes em relação ao aparato militar e, exigem maior e forte intervenção governamental.
Sobre esta desconfiança, o Presidente da República Filipe Nyusi, no Informe Anual sobre o Estado da Nação em 2020 confirmou que “por causa das intervenções dos nossos militares, eles agora têm estado com problema de logística porque as populações não estão naquelas zonas, mas também não conseguem ir roubar”.
Não obstante o estudo considerar moderada a resiliência comunitária, são visíveis tensões étnicas sendo que a proximidade de pessoas de diferentes origens foi percebida de forma negativa.
Na mesma nota, lê-se ainda que “volvidos estes três anos de opacidade neste combate ao terrorismo, o Governo e os Comandantes das Forças de Defesa e Segurança, desdobram-se em acções de propaganda política ao invés de prestarem os cabais esclarecimentos sobre o quê realmente está a acontecer em Cabo Delgado, e qual o plano para a urgente erradicação dos terroristas e outros bandos armados que semeiam luto e destruição naquela província. Pelo contrário, o Governo e as FDS têm sido intolerantes para com as forças vivas da sociedade que, ao abrigo dos seus direitos constitucionais, exigem apenas a verdade”, prosseguindo que “só com a verdade é que será possível mobilizar a nação para enfrentar este combate que não pode ser monopólio do Governo ou dos seus subordinados nas FDS. Está em causa a sobrevivência do Estado moçambicano, do nosso país e do seu tecido social. Não podem contar connosco para que, através do silêncio, sejamos cúmplices do agravar da situação militar, política e humanitária em Cabo Delgado, situação que pode degenerar numa verdadeira catástrofe de dimensões babilónicas caso nada seja feito o quanto antes”.
Ainda neste diapasão, o ND prossegue que “questionamo-nos nós de que soberania falamos quando contratamos unidades militares e mercenários russos e sul-africanos num contexto em que Cabo Delgado se transformou em negócio de guerra? A presença de tropas de mercenários não é actualmente uma perda de soberania nacional, ou será que alguém também tem seus interesses?”, relembrando que “quando na guerra contra a Renamo, o regime trouxe milhares de soldados dos países comunistas para reforçar os seus interesses, não se falava da perda da soberania nacional? Não será uma soberania conveniente para defender sua posição fragilizada, pouco transparente, e para negar a necessidade de chegar a acordos com países amigos na região para apoiar a resposta?”
“Quantos milhões de dólares os mercenários nos custam cada mês, quais resultados eles estão nos trazendo e quem se beneficia?”, questiona o movimento ND, para depois considerar que “para além de constituir um verdadeiro acto de traição à pátria, a mobilização de mercenários estrangeiros ao arrepio das normas constitucionais, representa uma verdadeira ameaça ao Estado de Direito Democrático e ao princípio de separação de poderes quando o Governo ignora o Parlamento em tão sensível matéria”.
Outra preocupação do ND é em relação aos acordos alcançados entre o governo e as empresas multinacionais, por isso “denunciamos também os dúbios acordos ocultos entre o Governo e as multinacionais que operam nos projectos de gás natural na bacia do Rovuma, mais preocupados em proteger sua presença e interesses, do que as populações locais, ignorando a resolução dos factores económicos e de exclusão facilitadores da adesão ao terrorismo”.
“O gás e o petróleo de Cabo Delgado não são mais importantes do que os milhares de vidas humanas ceifadas diariamente para além dos deslocados de guerra que são obrigados a deixarem suas vidas para atrás por conta da insuportável insegurança nos seus distritos”, apelam os jovens que lutam por mudanças políticas e governativas em Mocambique, questionando “quantos jovens soldados, com pouca experiência, por falta de treinamento e equipamento adequados, perderam a vida nestes anos de guerra ao terrorismo? Quantos pais, mães e cônjuges perderam seus filhos(as) e parceiros(as), que talvez com maior e melhor assistência poderiam estar vivos?”.
Considera ainda o ND que “a verdadeira perda da soberania nacional é o que temos nos territórios e áreas controladas pelos terroristas, onde não há presença de Instituições do Estado, não há polícia, nem administradores, nem médicos e nem maestros; zonas sem controlo e presença do Estado”.
Igualmente, a nota aponta ser “importante convocar os comandantes militares para sua adesão à realidade dos factos no terreno. O movimento da ND repudia com veemência o fraco investimento logístico e de treinamento dos jovens engajados no teatro operacional Norte. O Estado não pode, por incúria, corrupção ou roubos perpetrados por seus agentes, fazer desta juventude carne de canhão para os terroristas”, ao que exigimos por isso a verdade sobre o que está sendo feito para que os nossos briosos e corajosos jovens na frente de combate tenham os meios necessários para repelir os atacantes e defender a sua vida e das comunidades afectadas. É urgente prover assistência aos cidadãos no processo de fuga e reduzir o ambiente hostil de desconfiança e perseguição com que os deslocados são recebidos nas zonas seguras”. (Redação)