Nampula (IKWELI) – A cidade de Nampula, o mais importante centro urbano do norte de Moçambique, interrompeu o seu projecto de desenvolvimento actualista, há três anos, com o assassinato bárbaro de Mahamudo Amurane, o primeiro autarca eleito vindo de um partido da oposição.
Foi ao princípio da noite do dia 4 de Outubro de 2017 que tudo mudou na autarquia. Pouco depois das 18h, um desconhecido, sob um projecto e autoridade desconhecida, atirou, mortalmente, no autarca que tudo dava para colocar a cidade que o elegeu a brilhar.
Amurane dirigiu, perto de 4 anos, o município, e nesse período a qualidade de vida dos moradores que o confiaram, também, mudou para o melhor. O saneamento do meio, a transitabilidade, o transporte público de pessoas, os espaços de lazer, as vias de acesso e o abastecimento de água conheceram melhores momentos, incluindo o comércio informal que passou a mais organizado.
Daquela fatídica noite até aos dias que correm, o único exemplo que se encontra de um bom gestor público e autárquico recai na figura do malogrado Amurane, quer ao nível de Nampula, quer, também, no panorama nacional.
Alérgico a corrupção e a inoperância institucional, Mahamudo Amurane transformou os “sossegados” quadros que se mostravam improdutivos na era de Castro Namuaca em verdadeiros profissionais. E para melhorar a dinâmica introduziu novos profissionais e jovens na estrutura do executivo municipal.
No último domingo, 4 de Outubro, mais uma vez, a cidade de Nampula parou não para celebrar o dia da paz, mas para homenagear o seu verdadeiro herói, Mopoli, Mahamudo Amurane. Um grupo de amigos encabeçou, através da Associação Koshukuro, a deposição de uma coroa de flores na campa do malogrado, no cemitério municipal da Faina, onde repousam os restos mortais do falecido. Nas redes sociais, bares (que forçam a abrir nas escondidas, desrespeitando a decisão presidencial no âmbito da prevenção da covid-19) táxis de mota e encontros de amigos e familiares, apenas se lamentava o assassinato do malogrado.
O Ikweli acompanhou várias manifestações em torno da tragédia, incluindo que acompanhou a cerimónia de exaustação e respeito pelos feitos do malogrado no cemitério novo da Faina.
Maria Moreno, então vereadora do pelouro Institucional, Desenvolvimento e Cooperação na era Amurane, foi uma das caras visíveis no cemitério novo da Faina. Calma e serena, como é o seu normal, não escondeu a perda que sofreu com o assassinato do presidente, mas guarda a satisfação de ter servido a uma cidade sob o seu comando. “Sinto-me honrada por ter tido a oportunidade de ter trabalhado com uma pessoa carismática, responsável e tão criativa como foi o doutor Mahamudo Amurane. Ele trouxe-nos situações muito diferentes, porque ele era muito exigente, exigente, primeiro com ele próprio depois connosco. Então, trouxe qualidade na nossa forma de trabalhar e de servir, mas ao mesmo tempo era uma pessoa muito humilde, uma pessoa muito generosa. Ele elogiava-nos sempre que fizéssemos alguma coisa com valor e isso deu-nos, também, uma sensação de grande valor e de grande qualidade como pessoas, e isso é um legado que ninguém esquece porque realmente foi o único, foi o primeiro”.
“Por tantos anos passarem não nos vamos esquecer de Mahamudo Amurane, nem do seu trabalho, nem da sua personalidade, porque realmente entrou nas nossas vidas de forma que nunca mais vai sair”, garante Moreno, explicando que “nós hoje estamos a recordar essa data de um trágico acontecimento sim, achamos estranho que ainda não se saiba quem foi o autor, mas as vezes a dor se mistura com a esperança e a vida vai correndo sim”.
A fonte está segura de que “se não tivesse sido interrompido este sonho, realmente a cidade de Nampula estava numa rota de desenvolvimento muito acelerado e isso era um exemplo, não só para Moçambique, mas para toda África Austral. O doutor Mahamudo Amurane costumava dizer que nós seremos a melhor cidade da África Austral, eu acredito que sim se tivessem permitido chegar ao fim do mandato e repetir o mandato, como já eram os indicadores, certamente nós teríamos chegado aí”.
“Há um legado que, também, ele nos deixa, que é o convívio político, isso não deixo de falar, porque no seu governo havia pessoas de todas as origens políticas e algumas que não tinham nenhuma cor partidária, mas todos acolheu e todos tratou de forma imparcial e de forma generosa. Isso é, também, uma lição muito grande de vida. O poder local é isso, governar é isso, o edil está presente junto ao povo, as pessoas estavam muito próximas, ele estava muito próximo, e é por isso que há esta ligação e as pessoas têm dificuldades de esquecer, mas, prontos, queremos acreditar que Nampula começou e não vai parar este ritmo de desenvolvimento, queremos acreditar nisso”, concluiu Maria Moreno.
De 71 anos de idade, a munícipe Lúcia Afonso, também, não se fez de rogada, como forma de honrar a entrega do malogrado dirigiu-se ao cemitério Novo da Faina para, pelo menos, uma coroa de flores depositar na campa de Mahamudo Amurane.
“Por acaso passamos por aqui e sempre nos recordamos quando passamos pelos feitos que ele demonstrou na cidade de Nampula, enquanto eleito presidente do município. Aquilo que ele fez, foi aquilo que ele quis demonstrar o que é ser um dirigente numa zona como esta em que ele estava. Portanto, a maioria dos moradores, munícipes de Nampula sempre aderiram aquilo que era deste presidente Amurane”, disse a munícipe, anotando que “não sou nenhum membro familiar, sou simplesmente munícipe que fui acompanhando e vendo os feitos dele, e prontos fiquei sentida e magoada quando me apercebi deste assassinato dele e, até aqui, de facto faz-nos derramar lágrimas quando passamos por aqui e ver que este homem inocente podia dar muita continuidade daquilo que foi do carisma dele para a cidade de Nampula”.
A dona Lúcia revolta-se as autoridades judiciais que não conseguem esclarecer o assassinato. “A falta de esclarecimento dos actores deste crime, de facto de quanto em quanto, quando nos encontramos uma da outra, quando na memória nos aparece ele, não só, também outros casos, mas de facto foi um grande sentimento uma coisa feita em casa dele por alguém numa grande cidade desta com muita autoridade de investigação e não se ter conseguido investigado algo e dizer-se, concretamente, quem foi que praticou esta acção. Nós não contávamos que chegasse este momento sem que a lei, os nossos dirigentes aqui nos declarassem quem foi o autor deste crime, mas olhe, não temos mais nada por dizer, ficamos assim, continuamos sentidos por acaso, muito sentidos”.
Do processo remetido ao tribunal pela Procuradoria da República, os réus não foram pronunciados por insuficiência de provas, facto que fez com o mesmo retornasse ao Ministério Público para melhor produção de provas.
A este respeito, o Ikweli, na praça dos heróis conversou com o Juiz Presidente Provincial, Alberto José Assane, o qual disse que “o processo não chegou no tribunal, ainda está na Procuradoria, por isso não podemos dar detalhes”. (Aunício da Silva e Constantino Henriques)